sábado, fevereiro 02, 2019

(DL) Babette, uma admirável personagem de Karen Blixen


Uma das rubricas do «Literatura Aqui» costuma ter alguém a falar sobre o personagem literário, que mais o terá influenciado, servindo para demonstrar a validade de um provérbio vagamente alterado: «diz-me o que lês, dir-te-ei quem és».
Quando penso qual seria a minha escolha divido-me entre muitas possibilidades: o Robin dos Bosques, que descobri em criança, e que roubava aos ricos para dar aos pobres (estaria nele a futura adesão ao pensamento de esquerda?) ou o Ismael do «Moby Dick», que tanto me impressionou ao ler o romance de Melville? Mas que dizer do capitão Nemo e das suas viagens submarinas, ou do Sinbad das Mil e Uma noites, ambos possíveis influenciadores dos futuros percursos pelos sete mares do mundo?
Qualquer desses personagens se me ajustariam como uma luva, mas, perante um documentário sobre Karen Blixen, outra personagem - mesmo que descoberta já em adulto! - me poderia sugestionar a opção: Babette, a protagonista de um dos seus contos mais conhecidos que, fugida da Comuna de Paris para ser criada de duas austeras irmãs norueguesas, devotas dos rigorosos ritos protestantes, lhes subverte as convicções com um lauto jantar, aberto a todos os vizinhos da mesma comunidade ultraortodoxa, subitamente confrontados com os prazeres gustativos.
Ora, eu que muito guloso me confesso - daí a incorrigível obesidade! - defendo, em absoluto, o primado do hedonismo sobre as privações. Para quê ter longa existência à custa da escusa ao que dá prazer, quando ela pode ser mais amplamente vivida usufruindo-os em pleno, mesmo encurtada nalguns anos?
Adoto Babette enquanto paradigma da superioridade do pecado sobre a virtude, da jubilação sobre a hipocondria. Venha lá o mais fanático dos impolutos e castos valores a querer contrariar-me, que logo vê a corrida, que leva. As médicas, que o têm tentado, depressa colheram a resposta às suas porfiadas tentativas!

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