sexta-feira, fevereiro 08, 2019

(DIM) Desesperados à deriva entre dois continentes


O que terão sentido os novecentos e trinta e sete passageiros, que estiveram pouco mais de um mês a bordo do navio «St. Louis», entre 13 de maio e 17 de junho de 1939, primeiro convencidos de escaparem ao expetável desiderato das intimidações nazis de que se sentiam diariamente vítimas, depois a ele condenados, quando se viram impedidos de desembarcar em Havana, ou sequer entrarem nas águas internacionais dos Estados Unidos?
Não é difícil imaginar a bipolaridade entre as emoções inicialmente coloridas e as sombrias, que lhes sucederiam, e justificariam a ameaça ao capitão do navio de vir a arcar na consciência com a opção de duzentos deles pelo suicídio, precipitando-se borda fora.
Hitler queria demonstrar não ser só ele a tratar os judeus como párias, conseguindo a cumplicidade ativa dos governos que, do outro lado do Atlântico, acharam nada ter a ver com quanto se passava na Europa. E, só a muito custo, a Liga Judaica conseguiria o desembarque em Antuérpia, que seria alívio de pouca dura, porque muitos deles não tardariam a ver o avanço das hordas nazis na sua direção, e morreriam nos temidos campos de concentração de que, ilusoriamente, se haviam julgado poupados.
Regressei a esta trágica história através do filme de Stuart Rosenberg estreado em 1976 e que nunca tinha visto: «A Viagem dos Malditos» corresponde a um dos grandes títulos da época, projetado para salas imensas, com plateia e balcões e grandes cartazes nas fachadas dos cinemas a empolar a presença de tantos atores conhecidos, desde Faye Dunaway a Max van Sidow, de Orson Welles a Malcolm McDowell, de Katharine Ross a James Mason, de Ben Gazzara a Lee Grant, sem esquecer um dos primeiros desempenhos de Jonathan Pryce.
Era o tempo do «grande espetáculo» sem as irritantes pipocas e com as impressivas emoções despoletadas pelo que se via na tela a constituírem o mais eficaz argumento para se rejeitar o nazi-fascismo na dimensão em que, porventura, mais valerá execrá-lo. Porque, a bem ver, a racionalidade é ferramenta demasiado limitada para entender a barbárie...

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