domingo, maio 14, 2017

(DL) A cosmogonia de Edgar Allan Poe

Edgar Allen Poe teve uma existência curta (40 anos), mas a sua obra, nos mais diversos géneros literários, conseguiu ser brilhante.

Paul Halpern, um professor da Universidade de Filadélfia, cujo livro mais recente aborda como Richard Feynman e John Wheeler mudaram os conceitos de Tempo e de Realidade, publicou um extenso artigo na revista «Aeon» em que apresenta o autor de «O Corvo» como um visionário.

Poe tinha um enorme interesse por tudo quanto dissesse respeito à natureza, fascinando-o o seu lado potencialmente destrutivo. Num dos seus contos mais impressionantes - «A Descent in the Maelström» - conseguia prender o leitor com a descrição tensa e detalhada da atração de um navio por um vórtice em que se estilhaçava.

Halpern aborda, porém, outro texto - «Eureka» - poema em prosa criado no ano anterior ao da sua morte, em que revela uma notável intuição cósmica descrevendo algo parecido com o Big Bang, oito décadas antes de tal teoria ser imaginada por Lemaítre,  trabalhada por Gomow e, depois confirmada por Edwin Hubble. Estes considerariam tudo o que é material proveniente de um átomo primitivo muito denso, que se teria expandido numa explosão colossal.

Poe não se limitou a descrever o início do cosmos como um caos  sacudido por erupções vulcânicas, terramotos e outros fenómenos telúricos de dimensões inimagináveis. Logo nesse aspeto opunha uma perspetiva dinâmica do Universo à que o via estacionário, regido pelas leis mecanicistas formuladas por Isaac Newton.

É conhecida uma carta do autor da Teoria da Gravitação Universal em que admitia um início comum a todos os corpos celestes, comandado por Deus e respeitando a  cronologia  bíblica, que atribuía esse Génesis a 4000 a.C.

Embora conhecesse bem as propostas newtonianas, Poe imbuíra-se de influencia mais consentânea com a sua cosmovisão: a do naturalista Alexander Humboldt, que viajara pelos vários continentes e deles trouxera provas de uma história bem mais recuada do planeta e do Universo, contrariando os  dogmas da Igreja Católica.

Reconhecendo-lhe razão, Poe dedicou-lhe o poema. Nesse texto Poe desafia o leitor a aceitar a extensão infinita do espaço e o número ilimitado das estrelas nele existentes. Todas surgidas do que designou como a «Partícula» inicial, donde tudo irradiara esfericamente em todas as direções e até distâncias incomensuráveis.

A presciência de Poe não o conseguiu levar até à possibilidade de existirem várias galáxias, pois via o Universo como um núcleo central cercado por um imenso oceano de estrelas e de nebulosas gasosas. Mas convenhamos que os cientistas só em 1920 viriam a concluir que muitas dessas nebulosas eram afinal galáxias distintas daquela onde vivemos.

Poe teria, por certo, apreciado essa novidade.

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