quarta-feira, janeiro 25, 2017

(DIM) Vintenberg transformado em discípulo de James Ivory

Nunca li romances de Thomas Hardy só lhe conhecendo a obra através das adaptações cinematográficas de alguns romances. Primeiro foi «Tess», quando Polanski quis homenagear Sharon Tate, que o tinha como um dos livros preferidos, e agora «Far from the Madding Crowd», que o dinamarquês Thomas Vintenberg adaptou numa insuspeitada demonstração da sua flexibilidade temática e estilística. É que, quem dele recorda «Festen» ou «A Caça», não o imaginaria discípulo de James Ivory, cujos títulos abordavam com frequência as conturbadas histórias de amor em ambiente vitoriano. Como é o caso desta, passada por volta de 1870 no Dorset, donde Hardy era natural, e aí se vivia o período áureo dos grandes latifúndios, onde trabalhavam dezenas de operários agrícolas. Um mundo de que os protagonistas de «Downton Abbey» eram nostálgicos sucessores...
Bathsheba Everdene começa por ser uma precursora das ideias feministas ao tomar a seu cargo a vasta quinta herdada de um tio. Ao instalar-se despede o feitor, cujo desleixo quase levara a propriedade à ruína. E apesar de ter a corte, ora discreta, ora mais evidente, de dois pretendentes - Gabriel, de quem chegara a rejeitar o pedido de casamento quando ainda nada de seu tinha, e Boldwood, um proprietário ainda mais rico do que ela -, diz-se decidida a manter-se livre e focalizada na recuperação do seu domínio.
O problema será a vistosa farda com que o sargento Troy se lhe apresenta. É tiro e queda: o casamento concretiza-se logo depois, embora adivinhemos o quão insensata se mostrara na escolha afetiva. Na noite de núpcias, quando ele estimula todos os empregados da quinta a acompanharem-no na bebedeira, só resta ela para ajudar o previdente Gabriel a salvar as medas de cereais ameaçadas pela chuva anunciada pelas negras nuvens.
Vintenberg cumpre a regra romântica de equiparar os sentimentos dos personagens às manifestações tempestuosas da natureza. Como, igualmente, aqui se respeita outra não menos característica do género: as paixões contrariadas pelo sentido das conveniências, decorrente dos díspares estatutos sociais dos potenciais amantes.
Se Polanki escapava à tentação académica de moderar o que se revela mais cruel na situação das mulheres da época, aqui tudo sai bonitinho como se Vintenberg se acomodasse sem rebuços aos gostos do tipo de público a que se destina esta produção. Aquele para quem o happy ending é exigência a não descartar. Por isso mesmo o caprichoso Troy morre com os tiros disparados por Boldwood, conseguindo-se de uma assentada retirar da equação dois dos três vértices do quadrilátero amoroso. Ficam os outros dois - Gabriel e Bathsheba - enfim entregues à promessa de inesgotável felicidade e muitos rebentos...


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