quinta-feira, outubro 20, 2016

(O) O mistério que Scriabine nunca nos permitiu esclarecer

É daquelas questões que nunca terão resposta. Se não tivesse morrido precocemente aos 43 anos, em 27 de abril de 1915, aonde teria Alexander Scriabine levado a expressão do seu talento?
É que, nessa altura, ele estava a compor uma peça denominada «Misterium», que deveria implicar a colaboração de três mil executantes e a sua apresentação nos Himalaias para, com o poder místico nela incorporado, suscitar o Armagedão e dar início a um mundo
Nesse sentido, embora menos conhecido do que mereceria, Scriabine é uma das mais fascinantes personalidades da História da Música e de quem Aaron Copland diria ter sido o “melhor exemplo da inspiração pura”.
Ele nascera no dia de Natal de 1871 no seio de uma família aristocrática e muito religiosa. A morte precoce da mãe e a mudança do pai para a Turquia deixam-no aos cuidados de uma tia e de uma avó, que lhe darão uma educação muito condicionada pelo predomínio de presenças femininas.
Aos cinco anos o talento precoce começou a fazê-lo emergir, com as improvisações que interpretava ao piano.
Em 1883, e a exemplo dos adolescentes russos da sua condição, é matriculado num colégio militar para singrar na carreira das armas, mas o apelo dos galões não conseguiu competir com o gosto da música, razão para transitar para o Conservatório de Moscovo onde, entre outros professores, contou com a influência de Sergei Taneyev. Rachmaninov era um dos seus colegas e eles haveriam de se influenciar mutuamente.
O talento depressa se torna óbvio e ele parte para tournées em toda a Europa para interpretar peças da sua autoria, ainda filiadas na tradição de um Romantismo decadente, de que Tchaikovsky era o maior expoente.
Começa, então, a interessar-se pela Teosofia, na sua vertente mais esotérica, que associava a natureza divina a uma entidade universal.
Musicalmente evolui para uma estética original, que, segundo António Cartaxo, “ficava entre a luminosidade difusa de Debussy e o grotesco expressionista de Schonberg.”
Em 1903 ele repudiava as influências alheias, nomeadamente as de Chopin e de Wagner, que reconhecia terem sido importantes nas suas composições até então.
Emotivo, repentista e místico, acompanhava os excessos dos vanguardistas então envolvidos em movimentos revolucionários sem que ele se sentisse tentado a chegar a tal alinhamento.
Em 1905, a Terceira Sinfonia é a obra que marca a passagem definitiva para um novo estilo, sendo composta e estreada fora da sua Rússia natal e que ele intitulou «Poema Divino» por representar o espírito humano libertado das crenças e superstições para se entregar a essa cosmogonia universal.
Instala-se então nas margens do lago de Genebra com a mulher, Vera Isakovich, e os quatro filhos de ambos, mas depressa lhe surge Tatiana Fyodorovna, sua antiga aluna no Conservatório, com quem logo se vai instalar na Itália. É em pleno auge dessa emotiva relação amorosa, que compõe a opus 54, «Poema do Éxtase», que prenuncia a tal obra apenas iniciada e cuja majestosidade ficou por descobrir.
É essa peça de 1908, que aqui fica sugerida na edição de 2010 dos Proms com a Philarmonia Orchestra dirigida por Esa Pekka-Salonen.

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