sábado, setembro 26, 2015

ESTÓRIAS DA HISTÓRIA: Gertrude Caton-Thompson e o Grande Zimbabwe (3)

No texto anterior vimos como Gertrude Caton-Thompson estava quase a dar por terminada a sua expedição de 1929 ao Grande Zimbabwe, quando se lembrou de recorrer à perspetiva aérea para encontrar vestígios imersos na vegetação secular e passíveis de lhe garantirem as respostas procuradas.
Quem por ali andara à procura de tesouros não suspeitara do que se escondia nos socalcos adjacentes às muralhas. Logo no dia seguinte transferiu a equipa para esses terrenos onde começaram a aparecer à luz do dia alguns objetos, que tinham passado despercebidos nos séculos mais recentes.
Todos esses vestígios eram inegavelmente africanos. Havia alterações na cerâmica e nos seus desenhos, mas eram antecessores dos que então se produziam. O único material estranho que encontrou foi o das contas de vidro, da cerâmica do Extremo Oriente e do Próximo Oriente, indiciadoras de comércio marítimo com essas civilizações em meados do século XIII.
Gertrude concluiu assim que, ao contrário do pretendido pelas autoridades da colónia, o Grande Zimbabwe tinha sido uma cidade africana negra, que prosperara entre os séculos IX e XIV, no centro de pujantes rotas comerciais. Do interior para a costa transportava-se marfim e ouro para serem vendidos aos comerciantes árabes, que os enviavam para a Índia e para a China.
Para a reunião com os mecenas da British Association, Gertrude preparou-se para a reação hostil, que contava enfrentar. Foi em Joanesburgo que, com a sua lapidar segurança, apresentou as teorias a uma multidão interessada. Estava-se a 2 de agosto de 1929.
A apresentação foi meticulosa e clara demonstrando que, em vez de ser ramificação degenerada de outra civilização, o Grande Zimbabwe era o que restava de uma civilização nativa dotada de um elevado nível de organização. No seu relatório detalhado Gertrude matou o mito de uma civilização branca perdida. Tratava-se afinal de uma movimentada metrópole negra com cerca de 15 mil habitantes e um nível de desenvolvimento equivalente ao de outras europeias desse tempo.
Muitos dos que a ouviram ficaram escandalizados e teimaram em manter a crença nas suas deturpadas ideias. Eram os que descriam da capacidade dos africanos em criarem uma tal civilização e, furiosos, abandonaram a sala. Mas o mundo académico e científico valorizou devidamente o seu trabalho.
No final desse ano Gertrude partiu para Inglaterra, mas a controvérsia sobre o Grande Zimbabwe acompanhou-a. No ano seguinte o Museu Britânico em Londres abriu-lhe as portas para que pudesse explicar as suas descobertas. Que lhe valeram cartas injuriosas e ameaças anónimas, incapazes de a fazerem vacilar, por pouco que fosse, nas suas convicções. Para ela os contestatários não passavam de desprezíveis imbecis…
Embora não tenha conseguido comprovar as ligações entre os comerciantes do sul da Península Arábica com o Grande Zimbabwe - que procurou na sua expedição de 1938 - ela fica conhecida como aquela que demonstrou a origem africana de uma grande civilização desaparecida...

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