sábado, setembro 26, 2015

DIÁRIO DE LEITURAS: As falsas promessas da sociedade pós-industrial

Duas semanas atrás já aqui referi o ensaio «Le Monde est clos et le désir infini», que o economista francês Daniel Cohen publicou nas Éditions Albin Michel. Porque se trata de uma visão desassombrada sobre o mundo em que vivemos, vale a pena voltar a abordá-la.
Para o autor a atual revolução digital está a destruir muitos empregos.
Nos séculos XIX ou XX as evoluções tecnológicas na agricultura empurravam as populações rurais para as cidades onde facilmente encontravam emprego na indústria. A produtividade e os salários pareciam crescer imparavelmente.
Verificaram-se nessa altura três revoluções ao mesmo tempo: ao sucedido na agricultura e na industria somaram-se os prodigiosos avanços da medicina.
Hoje, ao contrário, os empregos que sobrevivem são os poupados pelas novas tecnologias, como por exemplo os dos entregadores de pizzas.
O mundo industrial tinha herdado o que de pior havia na sociedade rural: em vez dos nobres princípios formulados pelo Iluminismo do século XVIII, e traduzidos na Declaração dos Direitos do Homem, adotou a autoridade  dos patrões e seus encarregados, aos quais era preciso obedecer. O taylorismo intentou criar um mundo de produção, que reproduzisse as relações de forças da sociedade feudal, com cada um no seu patamar: o operário, o encarregado, o engenheiro e o patrão.
Como o crescimento da produção ia permitindo aumentar o salário de quem vendia a força de trabalho, conseguia-se uma relativa paz social à custa do operário poder comprar também um carro que, se não era igual ao do patrão, lhe garantia, ainda assim, um estatuto de sucesso junto dos seus semelhantes.
O milagre da revolução industrial foi o de criar o motor de um imobilismo social, aqui e além sacudido pelas lutas organizadas por sindicalistas cada vez mais acomodados às mordomias de participantes no embuste da concertação social.
A década de 60 veio anunciar o crepúsculo da sociedade industrial com o fim dos Trinta Gloriosos Anos e o início de uma nova era de aposta na criatividade em substituição da autoridade enquanto valor estruturante. Em vez da verticalidade na definição dos organogramas das empresas, passava-se a tender para a horizontalidade.
A Revolução de Maio de 1968 em França e os seus sucedâneos, um pouco por todo o lado, teve por estímulo a vontade de pôr fim às velhas sociedades fortemente hierarquizadas, que tinham perdurado durante todo o período industrial.
A História mostra-se perversa, quando vê a sociedade pós industrial, a tal que deveria contribuir para a emancipação dos indivíduos, desembocar na atual insegurança, feita de austeridade, de cortes nos custos do trabalho e na procura de tecnologias capazes de propiciar a redução do volume de mão-de-obra…
Em vez da organização hierarquizada viemos dar à gestão através do stress: «mostra-te criativo ou arriscas-te a ser substituído por um programa de computador!» é o tipo de discurso com que se ameaçam os assalariados.  «Inova ou morre!»
Chegámos a um tipo de sociedade que gerou o contrário do que chegara a anunciar. Vive-se na permanente inquietação de uma segurança definitivamente perdida, recordada com nostalgia!
Em texto posterior prosseguiremos com este diagnóstico que Cohen desenvolve sobre o mundo em que tentamos sobreviver...

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