sábado, setembro 26, 2015

DIÁRIO DE LEITURAS: Compreender o que põe em causa o futuro da classe média

Em «Le monde est clos et le désir infini» o economista francês Daniel Cohen demonstra que a evolução dos anos mais recentes tem ameaçado o futuro da classe média. Ela que tinha emergido da sociedade industrial para se afirmar nos empregos do setor terciário, viu estes postos em causa pela revolução digital. E, no setor público, ela havia sido o pilar do Estado-Providência até ser submetida aos requisitos da redução de custos associáveis ao que alguns designaram como «gorduras».
Hoje esse esmagamento da classe média ameaça os fundamentos da sociedade democrática. Porque cava-se o fosso entre os que as tecnologias condenaram ao desemprego e os que delas tiraram proveito.
É por isso que, hoje em dia, ser de Esquerda significa apostar na construção de um novo Estado-Providência capaz de devolver aos cidadãos a anterior sensação de segurança face ao futuro.
O antigo Estado-Providência herdado da Revolução Industrial já não se adequa aos nossos dias.
A nossa contemporaneidade passou por três momentos-chave, que importa compreender: o primeiro foi a da transformação financeira dos inícios dos anos 80, quando se desmantelaram as empresas industriais, assentes nos modelos taylorianos, em nome de critérios de rentabilização dos investimentos.
Foi a  época em que grandes grupos económicos se desmembraram para só restarem as empresas neles passíveis de garantir dividendos substanciais aos acionistas.
Depois, no início dos anos 90, surgiu a revolução digital, que veio transformar a forma de encarar a organização do trabalho no setor terciário. A consequente redução de postos de trabalho conduziu a um desemprego estrutural, que continua a ser o principal problema dos nossos dias.
A globalização, que surge a partir da segunda metade dos anos 90 e com maior impacto já neste século, é um fenómeno mais tardio. O papel preponderante assumido pela China nas trocas mercantis internacionais é tão espetacular quanto recente.
Pensar que a globalização é a origem de todos os nossos problemas é um erro: a destruição de empregos na indústria é em 2/3 dos casos devida à evolução tecnológica e só 1/3 é explicada pelas importações. Para o conjunto da economia essa proporção ainda se revela bem menor.
Daniel Cohen é taxativo: a China pouca importância tem na ameaça ao futuro da classe média. É por isso que a sua proposta assenta em transitar do primado da quantidade industrial para o da qualidade pós-industrial à luz dos ideais iluministas, que têm sido consecutivamente postos de lado.
No fundo há teorias, que atualizadas à luz da evolução dos novos meios de produção, voltam a ganhar pertinência. E o marxismo é decerto uma das mais prometedoras de entre elas...

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