quarta-feira, julho 18, 2007

A RÚSSIA DE PUTIN FACE AOS ESTRATEGAS ATLANTISTAS

É uma constatação óbvia nesta altura: o Ocidente estava a pedi-las. O governo russo pode estar a desenvolver uma acção diplomática muito significativa para corresponder às contínuas provocações dos governantes europeus.
Recordemos alguns factos essenciais: primeiro houve Gorbatchov, que entusiasmou os arautos dos méritos do liberalismo económico, ao promover a destruição do muro de Berlim. E sucedeu-lhe Ieltsin, que compensava em populismo, a sua falta de ideias para a tremenda crise em que mergulhou a antiga União Soviética.
Ao ver a antiga pátria de Lenine e de Estaline desagregar-se, o Ocidente regozijou-se: não só se esbatiam as tensões da Guerra Fria, como se abria um mercado não despiciendo para os seus produtos manufacturados. Mesmo que à custa do enriquecimento ilícito e abrupto de uns quantos oligarcas, sendo a outra face da moeda caracterizada por milhões de cidadãos ex-soviéticos mergulhados na miséria mais desesperante, se não mesmo em aterrorizantes cenários de guerra civil (na Geórgia, na Chechénia) ou de atentados terroristas.
Foi nesse quadro, que subiu ao poder o actual Presidente russo. Directamente chegado do universo da espionagem, a sua condição de delfim de Boris Ieltsin, Vladimir Putin suscitava alguma complacência. Tanto mais que o antigo Império do Mal demonstrava fragilidades nas suas próprias estruturas militares, como o bem atestava o afundamento do submarino Kursk. A Rússia era um leão a quem tinham afiado as garras e cortado a juba.
Era, porém, Mark Twain quem dizia serem exageradas as notícias, que o davam como morto. E aconteceu o mesmo com a Rússia de Putin. Quem então se deleitava com as elucubrações teóricas dos neoconservadores norte-americanos e se extasiava com as vitórias militares no Afeganistão ou no Iraque esquecia-se que este é um mundo a mover-se em torno de algumas matérias-primas essenciais. E, quer em petróleo, quer em gás natural, a Rússia é um potentado.
Confirmando a sua estatura de estratega visionário, Putin logo tratou de açambarcar para o Estado esses recursos, que alguns oligarcas tinham aferroado com uma apressada avidez. E confrontando-se com as frequentes provocações ocidentais, que estenderam as fronteiras da NATO até às suas fronteiras, preparando-se agora para apontar daí algumas ogivas nucleares, Putin vem agora demonstrar quão perdida foi a oportunidade europeia de preferir o chamado eixo atlântico à gaulista hipótese de uma comunidade do Atlântico aos Urais.
À morte de um crápula (Litvinenko) reagiu com a escusa a entregar a Londres um provável homicida (Lugovoi), à tergiversação com o terrorismo checheno parece ter apostado no silenciamento dos seus cultores (Politovskaia), à independência de algumas jóias da coroa soviética (Ucrânia, Geórgia) correspondeu com sabotagem às estratégias dos seus líderes pró-norte-americanos), à expulsão de diplomatas russos do Reino Unido prepara-se para responder com um quase corte de relações com o governo de Sua Majestade.
Como dizia Miguel Monjardino num comentário radiofónico a Europa aprendeu a lidar com o poderio norte-americano, mas não encontrou um modelo eficaz de lidar com o re-emergente poderio russo. Adivinham-se, pois, tempos difíceis para uma Europa, que se colou em demasia às falidas teses do Pentágono...

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