segunda-feira, julho 23, 2007

Belle Toujours

Desilusão é o que suscita o mais recente título de Manoel de Oliveira, «Belle Toujours». Que pretendia homenagear Luis Buñuel, que assinara «Belle de Jour», e o seu argumentista Jean Claude Carrère.
Quarenta anos atrás, o filme do realizador espanhol era bastante subversivo: Severine (Catherine Deneuve), uma jovem mulher muito bela, não consegue ter prazer sexual com o marido e decide experimentá-lo enquanto prostituta na casa de passe de Mme Anaïs (Geneviève Page). Mas esquecer que incorre, então, em dois riscos: que aí seja reconhecida por um conhecido do marido, Pierre (Jean Sorel), o que acaba por se verificar com o detestável Husson (Michel Piccoli), doravante em condições de a chantagear; que suscite a paixão de alguém apostado em a retirar daquela vida e a entregar-se-lhe só a si: o que ocorre com o delinquente interpretado por Pierre Clémenti, que se faz matar pela polícia numa rua parisiense depois de alvejar Pierre com diversos tiros.
A Severine fica reservado o papel de enfermeira zelosa de um marido incapacitado a quem desconhece se Husson contara toda a sordidez da sua traição.
Como a Revolta de Maio de 1968 ainda não ocorrera imagine-se o impacto de um filme sobre o desejo no feminino e sobre as taras ligadas ao sexo (incluindo o incesto, a necrofilia, o sadismo, o masoquismo) num público ainda muito conservador…
Na revisitação dessas personagens, Manoel de Oliveira mostra-se incapaz de manter essa característica fundamental por elas assumida quatro décadas atrás.
Os objectivos de Severine e de Husson ao reencontrarem-se acabam por convergir num só: tentarem compreender: a ela interessa, sobretudo, perceber a razão de ser da lágrima paralisada a meio do rosto de Pierre, quando Husson o visitara: teria este cumprido o seu voto de contar toda a verdade ao homem mudo, cego e paralisado, reduzido ao seu estado quase vegetativo?
Por seu lado, Husson quer alcançar esse mistério presente na alma feminina de Severine: o que a impulsionava para a perversão?
Nenhum deles conseguirá a sua resposta, porque são insolúveis os percursos íntimos de cada um. E estabelecer pontes revela-se tarefa quase impossível...

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