sexta-feira, março 20, 2020

(NM) O legado bizantino nas obras de El Greco


Confesso nunca ter sentido grande interesse pelas obras de El Greco, que subalternizei em relação aos que, a seguir, viriam dar o conhecido lustro estético ao siglo de oro espanhol - Velasquez e Zurbaran.  Uma reportagem em Creta fez-me, porém, reequacionar o preconceito: aquilo que mais diferencia as suas obras em relação aos contemporâneos é a paleta de cores e a tendência para alongar as figuras humanas de acordo com a tradição através da qual chegou à pintura.
De facto Domecicos Theotocopoulos nasceu na referida ilha grega em 1541 e só a deixou vinte sete anos mais tarde para nunca mais ali voltar. Nascido numa família da burguesia mercantil, que prosperava à conta da ocupação veneziana, começou por experimentar a arte dos ícones ortodoxos, nela dando provas do seu talento.
Não fosse a atração pela pintura veneziana, então no seu fulgor, e talvez se tivesse contentado em permanecer na ilha natal. Mas o apelo foi irresistível, levando-o a viver na cidade dos doges antes de se mudar para Espanha. Em 1575, quando pintou Cristo cura do cego demonstrou já ter o domínio absoluto da perspetiva e o sentido arquitetural.
Foi em Espanha, e particularmente em Toledo, que executou as obras mais conhecidas. Algumas delas, como A Abertura do Quinto Selo assumiram uma tal modernidade, que, acaso nos escondessem o nome do artista poderíamos aceitá-la perfeitamente como criada no século XX.
Daí que a reportagem nos faculte uma tese difícil de pôr em causa: mesmo distanciado geográfica e temporalmente da terra natal, El Greco nunca deixou de refletir nas obras a herança cultural em que se deixara embeber no primeiro quartel da sua vida.

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