segunda-feira, março 09, 2020

Nas margens: A pífia herança de um ano de viragem


Terrível o ano de 1979, de cujos acontecimentos ainda estamos a pagar com enormíssimos juros os inesperados custos.  No início desse ano os líderes dos quatro principais países ocidentais eram Jimmy Carter, James Callaghan, Helmut Schimidt e Valéry Giscard d’Estaing, mas nenhum deles era particularmente benquisto pelos governados. O primeiro-ministro inglês era o mais contestado: as greves dos sindicatos paralisaram a Inglaterra e até os mortos ficaram por enterrar por não haver quem o fizesse. Apesar de se tratar de um governo trabalhista, foram os sindicatos, com ele conotados, a precipitaram-lhe a queda e a abrirem caminho a Margaret Thatcher, que não tardaria a partir-lhes a espinha. Ademais, apesar de depressa se constatar a inadequabilidade da receita ultraliberal para infletir a crise britânica Thatcher contou com a ajuda providencial dos generais argentinos que, invadindo as Malvinas, lhe proporcionaram o toque a rebate, que manteve os conservadores no poder nos dezoito anos seguintes.
Mas convenhamos que as esquerdas radicais continuam a esquecer as reiteradas lições da História - como a de então! - quanto ao seu papel ativo na entrega do poder às direitas mais conservadoras.
Nesse mesmo ano de 1979 o xá do Irão fugiu do país, quase se cruzando no aeroporto com o aiatola Khomeini. A Revolução democrática, que milhões de iranianos saudaram na expetativa de recuperarem os auspiciosos tempos do governo de Mossadegh, depressa se viu espezinhada pelo fanatismo dos prosélitos do líder religioso. Uma vez mais a crise na economia tendia a corrigir o erro de lhe ter sido dada tanta primazia, mas a invasão iraquiana, decidida por Saddam Hussein, serviria de balão de oxigénio ao novo regime, que embandeirou a causa patriótica para reprimir sem contemplações quem se lhe opôs.
No Vaticano foi empossado o polaco Karol Wojtyla, que hoje sabemos ter sido protetor de pedófilos mas ainda é celebrado pelo conluio com a CIA para acabar com o comunismo na Europa do Leste. Lamentavelmente também foram os operários de Gdansk a darem tiros nos pés secundando a ação conspirativa do clero polaco. Como prémio ver-se-iam a breve trecho condenados ao desemprego, porque a viragem para o capitalismo selvagem significou o fecho dos estaleiros onde tinham ganho o sustento durante décadas.
Na China Deng Xiaoping cuidou de enterrar as veleidades maoístas quanto a uma sociedade sem classes e libertou parte substancial dos mercados internos à iniciativa privada. Os sucessos económicos e financeiros subsequentes talvez dêem razão a Lenine quando definiu o socialismo como o resultado da soma entre o capitalismo e a eletricidade. Mesmo com alguns incidentes de permeio na praça Tiananmen,
Em síntese; 1979 foi o ano em que, por todo o mundo, mais gente de se manifestou a exigir melhor vida e menores desigualdades. Mais de quarenta anos depois convenhamos que os resultados revelaram-se pífios.

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