quinta-feira, março 26, 2020

(DIM) Chaplin compositor e com simpatias políticas óbvias


A partir de Luzes na Cidade (1931), Charles Chaplin começou a incumbir-se das bandas sonoras dos seus filmes. E sabemos bem quanto potenciam tantas das cenas que deles recordamos. No entanto ele desconhecia totalmente a forma de traduzir para as pautas os sons congeminados dentro de si. Daí que se fizesse acompanhar de um assistente musical, cuja função era ouvir-lhe as melodias consideradas como as mais adequadas para cada cena e depois vertidas para o papel. Só quando as ouvia interpretadas por uma orquestra ou um ensemble é que Chaplin dava o devido assentimento não sem antes lhes alterar aqui e ali uma nota que lhe soasse menos conforme com o pretendido.
É esta outra prova da genialidade multifacetada do artista: a de criar previamente na mente aquilo que depois seria ouvido com os seus filmes.
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Na sua autobiografia Paulette Godard, que foi a terceira das suas esposas, ri-se da ideia de Chaplin ter sido comunista, porque a ânsia em acumular riqueza era nele indisfarçável. E poderia atestá-lo através do que ele dissera sobre Tempos Modernos: pretendia tão só fazer um divertimento de sucesso.
Contradiz essa ideia o facto desse ser o primeiro filme produzido depois de catorze meses passados numa longa digressão mundial fora do solo norte-americano. Quando ali voltou  confrontou-se com as mais chocantes evidências dos efeitos retardados da Grande Depressão de 1929. Ademais, fora durante essa ausência que se começara a interessar pela economia e com a forma como ela condicionava os regimes políticos e os comportamentos sociais. Daí que o crédito relativo às despeitadas palavras de Paulette Godard não deva ser levado a sério. Tanto mais que, logo a seguir ao filme de 1936, criou um outro -  O Grande Ditador - que causou embaraços em Hollywood. Em 1940, os Estados Unidos ainda não estavam na guerra e Hitler até era idolatrado por muitos norte-americanos. Ora a mensagem antifascista era indisfarçável nesse filme memorável.
Mas se dúvidas ainda houvesse, o crápula que, anos a fio, dirigiu o FBI encarregar-se-ia de esclarecer: ao manter um dossier aberto sobre Chaplin desde o início da década de 20, Edgar Hoover forneceu-o como alimento à perseguição macartista, que o obrigaria a abandonar de vez os Estados Unidos para nunca mais lá voltar.
Daí que, por muito que tantos quisessem depreciá-lo por parecer ser o que não fora, as próprias circunstâncias fizeram de Chaplin um símbolo ideológico da esquerda.

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