quarta-feira, março 25, 2020

(A) Recordar Offenbach um ano passados sobre o seu bicentenário


No ano transato decorreram diversas comemorações relativas ao bicentenário do nascimento de Jacques Offenbach, mas pouco eco tiveram entre nós. Embora a opereta tivesse conhecido grande apreço do público lisboeta durante décadas a fio, o género tornou-se obsoleto na segunda metade do século transato. Ou seja, quase um século passado sobre a invenção do termo para designar um tipo de espetáculo alegre, de curta duração, cantado e com diálogos de permeio para melhor situar as sátiras aos seus contemporâneos.
Foi por essa altura que, depois de cinco anos como diretor musical da Comédie Française, Jacques Offenbach inaugurou um pequeno teatro numa esquina dos Campos Elísios, o Bouffes-Parisisiens, que se obrigava a apresentar peças num só ato, capazes de porem os hedonistas do Segundo Império a rirem-se de si mesmos. Reivindicava-se uma certa influência da opera buffa italiana, mas com menores pretensões.  Mas, três anos depois, ou seja em 1858, Offenbach contornou a regulamentação a que se obrigara e, com Orfeu nos Infernos, conseguiu um extraordinário êxito popular, que muito agastou Berlioz por ver um tema sério convertido em comédia. É que ao contrário do ditado pela mitologia grega Orfeu ficara satisfeito por se ter visto livre de Euridice e só se decidiu a resgatá-la nos infernos, a mando do pai dos deuses, manifestamente preocupado com as más-línguas.
Nos doze anos seguintes Offenbach viveu o período áureo da sua vida musical estreando obras em catadupa, sempre com grande aceitação por parte dos parisienses. Mas a queda do Segundo Império também o arrastou para o declínio, porque regressava em força a moral puritana, que o designaria como «o grande corruptor». Tanto mais que só se naturalizara francês em 1850, tendo nascido alemão em 1819 numa família judia em que o pai era cantor na sinagoga. O ambiente histérico em torno do capitão Dreyfus ainda demoraria a revelar-se mas, como sempre sucede neste tipo de comportamentos racistas e xenófobos, o caldo de cultura datou de três décadas antes.
Quando morreu em 1880 Offenbach acabara de concluir uma belíssima ópera - Os Contos de Hoffman, mas já não a viu estrear-se. Cento e quarenta anos depois, essa obra e muitas das suas operetas continuam a suscitar particular deleite entre os melómanos ...

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