segunda-feira, fevereiro 06, 2017

(DIM) Steve Jobs, um mito ambíguo

Tivesse sabido que Aaron Sorkin era o autor do  bipic dedicado a Steve Jobs e  seria mais lesto a vê-lo. Porque tudo quanto tenho visto de Sorkin, imediatamente me faz render ao tipo de estória por ele concebido. Mesmo quando adota como realizador um inglês pelo qual não tenho apreciação particularmente positiva (embora aqui não consiga estragar o argumento, que lhe puseram à frente).
Não tinha, igualmente, qualquer curiosidade pela personalidade do criador da Apple, cujo mau feitio era lendário, apesar da genialidade que lhe reconheciam. Mas vê-lo interpretado por Fassbender já era motivo para reequacionar as desconfianças.
Entrei, pois, no filme sem grandes expetativas e acabei por rever bastante em alta essa predisposição. Em primeiro lugar por não haver aqui qualquer referência à doença, que viria a ser fatal para o protagonista e passível de, em mãos alheias, servir para tonalidade melodramática como se vê dispensável. Depois devo reconhecer que, ao contrário do que pudesse pressupor, não há aqui nenhuma tentação hagiográfica: Jobs é apresentado como execrável no comportamento para com os outros, particularmente a ex-companheira, cuja reputação trata de manchar nas páginas dos jornais, e a filha, que demora a reconhecer enquanto tal. A genialidade para as informáticas também é aqui desmistificada, porque vale-lhe, sobretudo, o tipo de liderança muito pressionante sobre verdadeiros talentos que contratara para as suas equipas.
Acresce ainda a falta de escrúpulos de apresentar produtos ainda em fase de conceção e para os quais publicitava capacidades redondamente falseadas.
Mitiga-lhe os maus fígados a paciente Joanna (excelente desempenho de Kate Winslet), que o insta, nos momentos determinantes, a corrigir as decisões mais polémicas. E há também John Soulley (Jeff Roberts), que fora buscar à Pepsi para ser o CEO da Apple e a quem trata com tal desconsideração, que se vê por ele despedido da empresa, que julgara sua. E, no entanto, mesmo prejudicado na carreira e difamado na imprensa, nunca deixa de dar a Steve as provas da verdadeira amizade.
Sorkin deixa-nos perceber que Jobs vive obcecado com o sucesso como catarse do sentimento de rejeição colhido na primeira infância porque, rejeitado à nascença pela mãe e pelos primeiros pais adotivos ao fim de um mês, nunca conseguiria vir a resolver o quanto isso significara em sofrimento íntimo. Que implicava tornar imensamente infelizes quase todos quantos o rodeavam é a conclusão, que Sorkin nos permite visualizar.



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