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quarta-feira, junho 25, 2025
Rumo à Felicidade” de Ingmar Bergman: a melodia da ambição
Ao abordarem-se os realizadores que diluíram a fronteira entre a vida e a arte, o nome de Jean-Luc Godard surge de imediato por ter na obra um espelho das suas relações, pensamentos e contradições existenciais. No entanto, já antes, Ingmar Bergman trilhava esse caminho, vertendo a própria experiência e angústias para a tela.
"Rumo à Felicidade" (Till glädje), de 1950, é um exemplo dessa simbiose, um filme sobre a insatisfação perante o fracasso das ambições e a cegueira em relação à felicidade que o amor pode oferecer.
O "síndrome do sapateiro apostado em tocar rabecão" – a persistência teimosa em algo para o qual não se tem aptidão ou, neste caso, o sucesso desejado – encontra em Stig, o violinista protagonista, a personificação dolorosa. Ele é um homem consumido pela ambição de ser um solista de renome, um virtuoso que arranque aplausos e admiração. Contraria-o a realidade do seu talento, que, embora competente, não atinge o brilho que idealiza. Essa frustração constante torna-o amargo, egoísta e incapaz de apreciar o que tem.
É aqui que entra Marta, a esposa, uma violinista que partilha a paixão pela música, mas possui uma perspetiva de vida pragmática e afetiva. Ela configura a alternativa de realização pessoal no amor, na construção de uma vida em família, oferecendo a Stig uma âncora, um refúgio, uma fonte de alegria genuína.
O ego e obsessão pelo sucesso individual impedem-no de ver a profundidade e a beleza do amor que Marta lhe oferece, focado que está no palco sem ouvir a melodia tangida no seu desprezado lar.
Nesta altura Bergman era um jovem realizador a lutar com as próprias inseguranças e ambições. As dificuldades no casamento e a pressão para se afirmar artisticamente eram realidades bem suas conhecidas. "Rumo à Felicidade" traz reflexões sobre os sacrifícios que a arte exige, e o perigo de perder-se na busca de um ideal inatingível, negligenciando a verdadeira felicidade inerente às relações humanas.
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