sábado, dezembro 24, 2016

(DIM) «No Nevoeiro» de Sergei Loznitsa (bis)

A culpa. A que se tem e se esconde. A que não se tem e todos no-la atribuem.
Os três homens que avançam pela floresta, para que um seja morto como traidor, escondem em si verdades, que os outros não querem ouvir, ou que eles próprios não se dispõem a com eles partilhar.
O condenado bem gostaria de convencer os carrascos, mas também os vizinhos, e sobretudo a própria esposa, em como fora um mero peão de uma tragédia, que nunca estivera ao seu alcance evitar.
Ele até desaconselhara os colegas ferroviários a não sabotarem o comboio, que os ocupantes alemães fariam em breve passar pela linha, que estavam incumbidos de reparar. E, apesar de torturado, calara quem tivera a ideia e a executara. Por isso teria preferido ver-se pendurado na forca como sucedera aos companheiros.
O comandante alemão preferira outra alternativa, mais perversa, e que o condenaria ao opróbrio: soltá-lo sem qualquer explicação. Ao vê-lo afastar-se da esquadra sabia o que o esperaria: em vez de herói seria dado como traidor e ver-se-ia condenado pelos resistentes.
Estivessem atentos e talvez os conseguissem atrair a uma cilada. É isso que Sushenya tenta dizer a Burov, mas este recusa ouvir. Porque para ele existe a indignação quanto a ter visto um amigo de infância, alguém com quem partilhara as brincadeiras de miúdos, a render-se aos inimigos. Aqueles que aprendera a execrar desde que a irmã fora assassinada e o tinham espoliado do único bem de valor que prezava, a carrinha em que até eles chegarem se deslocava.
E Voitik ainda menos o ouve, ciente das silenciadas traições, entretanto cometidas por cobardia, como sucedera quando levara as milícias junto de quem lhe fornecera comida para se manter na clandestinidade.
Se a tragédia se cumpre com os dois carrascos a morrerem primeiro do que o próprio condenado é precisamente por Voitik falhar na tarefa de vigilância que Bursov lhe atribuíra, estando a dormir quando deveria estar de olhos bem abertos.


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