quinta-feira, dezembro 15, 2016

(DIM) Clandestinas opções

1. «Mercúrio» é uma curta-metragem rodada por Sandro Aguilar em 2010 com recurso a uma mínima estrutura de apoio. O cenário é o de um terreno semiabandonado nas traseiras da própria casa, à beira de uma pequena floresta. Os atores, Isabel Abreu e Albano Jerónimo, eram simultaneamente seus amigos, e tinham estado a rodar com ele um projeto anterior mais ambicioso («Voodoo»). E somava-se ainda outro amigo, técnico de som.
Em dois sábados consecutivos os quatro juntaram-se, e em meia dúzia de horas, rodaram esta história de um encontro amoroso clandestino, de que pouco nos apercebemos, porque a câmara explora sobretudo os reflexos nos vidros, que sugerem bem mais do que revelam.

Existe o pormenor da criança deixada sozinha no carro pelo personagem masculino, enquanto este estará no da mulher, que ali o espera (só a ele ou a todos quantos lhe pagarem os serviços?). Tecnicamente reconheça-se uma excelente transposição dos sons da natureza, sobretudo os das aves nas copas das aves, perfeitamente indiferentes ao olhar triste da mulher devolvida à solidão de quem do futuro pouco esperará.
2. «Outra Forma de Luta» de João Pinto Nogueira parte de  uma ideia com potencial: em 1985 o escritor Nuno Bragança encontrou o líder histórico do PRP e entregou-lhe uns papéis com treze perguntas biográficas, que desejaria traduzir numa personagem de futuro título literário.
O problema é Bragança ter morrido inesperadamente dois dias depois desse último encontro, sem que Carlos Antunes tivesse correspondido ao pedido do amigo. Por isso, e enquanto forma de autocompensação da irremediável sensação de perda, coloca-se perante a câmara e narra-se no período que vai da sua infância minhota até muito depois do 25 de abril, quando conheceria as prisões políticas do novo regime. Sempre de acordo com o guião então recebido.

De permeio vão-se sucedendo representações das cenas mais significativas de «Square Tolstoi», o romance que o autor das questões escrevera sobre a experiência de, a partir de Paris, manter viva a chama da luta contra a ditadura.
Sobre o percurso de Carlos Antunes e de Isabel do Carmo, que com ele coliderou o período mais importante das Brigadas Revolucionárias, fica a noção de terem tomado o comboio da História na altura certa - aquela em que as suas ações revolucionárias melhor fizeram tremer os já periclitantes alicerces do regime - mas dele se apearem sem quase disso darem conta, tornando-se, depois do 25 de abril, incómodos figurantes de lutas de que se sentiram excluídos.
Derrotados da quixotesca tentativa de manter viva a chama em 25 de novembro de 1975, ver-se-iam depois sujeitos aos ódiozinhos de estimação de Ramalho Eanes, cuja probidade fica aqui seriamente comprometida.
Convenhamos que, na História da luta antifascista dos anos 60 e 70, terão desempenhado papel merecedor de referência, mas depois, condenaram-se ao quase anonimato de que já não se conseguiram libertar.

 

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