É claro que não percebi nada do filme, quando vi «O Ano Passado em Marienbad» pela primeira vez. Ainda estava a entrar na adolescência e deparava com um filme, que começa com um longo travelling, monotonamente descritivo, sobre os objectos pendurados nas paredes de um hotel majestoso. E segue-se depois a vaga intriga de uma mulher dividida entre o marido e o amante, mas sem que nenhum desses personagens exprima emoções, como se deambulassem por aqueles longos corredores e salões, sem sentirem verdadeira vontade para romperem com uma abulia quase epidémica.
Estranho objecto artístico esse, que levou a maioria da plateia aonde me sentava a sair para o calor estival da Costa da Caparica à espera do filme de gangsters, que se seguiria (a versão sinatriana de Oceans’s Eleven) na segunda parte.
E, no entanto, o miúdo ingénuo, que então era, sentiu algum sortilégio por aquelas imagens diferentes de tudo quanto até então vira e esforçou-se por compreender o que lhe parecia mais acessível.
Quarenta anos depois sinto algum alívio ao constatar que Volker Schlondorff, que era então assistente de realização de Alain Resnais nessa aventura, também nada entendia do que se filmava à sua frente. Como parecia, igualmente, o caso da maioria dos técnicos e actores envolvidos nessa produção. Só Resnais parecia dominar o conhecimento do que se pretendia, muito embora viesse depois a confiar a sua insegurança bem disfarçada relativamente a essas oito semanas de rodagem no castelo onde antes Kubrick já rodara «Paths of Glory».
Schlondorff confessa o mesmo fascínio por esse espaço solene donde qualquer psicologia parece ausente e onde nada se parece passar. E essa sensação de se estar a fazer algo até então nunca tentado, porque desaparecia a continuidade no tempo e no espaço.
A bela Delphine Seyrig tinha a câmara focalizada em si, prova da declaração de amor cinematográfica, que Resnais então lhe transmitia. Mas estes filmes então rodados pela actriz Catherine Spira durante a rodagem, agora montados por Schlondorff, manifestam, sobretudo, um grande amor pelo cinema.
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