Tenho uma grande simpatia pela realizadora e atriz Alice Rohrwacher. À partida estou sempre disponível para descobrir os seus filmes com a maior das disponibilidades para deles formular um juízo positivo. E, no entanto, reconhecendo muitas qualidades a este título de 2023, não consegui sentir grande empatia pela história, pelos personagens e pelo contexto em que tudo decorre.
“A Quimera” é, sem dúvida, uma obra que carrega a assinatura poética e singular de Rohrwacher: a câmara que dança entre o real e o imaginário, os rostos que parecem guardar segredos ancestrais, e a paisagem toscana que transforma-se num espaço quase mítico. A realizadora continua fiel à estética artesanal, filmando em película, com uma textura visual que evoca o cinema dos sonhos e da memória. Há beleza, há intenção, há risco.
Mas talvez seja precisamente essa busca pelo etéreo — pela quimera — que me afastou da experiência emocional. Arthur, o protagonista, vagueia entre tumbas e fantasmas, guiado por uma dor que nunca se revela por completo. Os personagens que o rodeiam, embora ricos em simbolismo, parecem distantes, como figuras de um teatro arcaico que não se deixam tocar. E o contexto — o tráfico de relíquias arqueológicas — embora fascinante, surge envolto numa névoa de alegoria que, por vezes, obscurece o drama humano.
Não é que o filme falhe. Pelo contrário, “A Quimera” cumpre o propósito de ser uma meditação sobre o desejo, a perda e o valor do passado. Mas talvez falhe comigo, espectador que procura, mesmo na abstração, um ponto de contacto afetivo. A beleza formal não bastou para me envolver; senti-me como quem observa uma tapeçaria antiga — admirando os bordados, mas sem conseguir decifrar a história que conta.
Ainda assim, continuo a acompanhar Rohrwacher com o mesmo entusiasmo. Porque mesmo quando não me toca, ela desafia-me. E isso, no cinema, é já um gesto precioso.
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