Na última década do século XVIII, Haydn viajava entre Londres e Viena, aonde a sua obra merecia significativo reconhecimento.
Foi numa das estadias em Londres, que se sentiu impressionado pelos concertos com as oratórias «Messias» e «Israel no Egipto» de Haendel na abadia de Westminster. A majestosidade do cenário, associado às centenas de intérpretes de reportório tão impressivo, deram-lhe a súbita vontade de trilhar idêntico percurso criativo.
Ora, esse antecessor chegara a ter um libreto disponível para uma nova oratória, que nunca chegaria a compor: «A Criação» baseada nos textos bíblicos (Genesis e Salmos) e num poema de Milton («Paraíso Perdido»).
Haydn pega nesse libreto e dedica-se a ele a partir de 1796, concluindo a sua obra dois anos depois, quando a estreia em privado, só a apresentando publicamente em 1799. Recorrendo a áreas, a recitativos e a trechos corais, ele sugere uma grandiosidade da obra divina, que condiz com as suas preocupações místicas. Em plena Europa das Luzes, cujo optimismo ele também perfilha, Haydn conhece grande sucesso por ir ao encontro de uma cada vez maior tradição vienense pela música erudita.
Na versão ontem e anteontem apresentada na Gulbenkian, no concerto de inauguração da temporada, a orquestra e o coro da instituição merecem tão exaltante elogio quanto o jovem maestro letão Ainars Rubikis, estrela ascendente do panorama musical dos nossos dias, na linha de um Dudamel, que o antecedeu enquanto vencedor do prestigiado prémio Mahler para recompensar a excelência dessa arte.
De tão gratificante espectáculo ficam apenas as dúvidas quanto à aparente mediania dos cantores: a soprano Ruth Ziesack, o tenor Robert Murray e o barítono Neal Davies.
Em contraste com o pobre início de temporada do CCB, o da Gulbenkian reagiu à pusilanimidade destes tempos difíceis com um concerto exaltante na capacidade para crer que há sempre universos por criar a partir de qualquer caos inicial...
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