sábado, janeiro 23, 2016

DIÁRIO DAS IMAGENS EM MOVIMENTO: «Minha Mãe» de Nanni Moretti

É possível viver este presente sem estar deprimido? É esta uma das questões, que o filme de Moretti levanta e não consigo imaginar o efeito devastador, que teria ao vê-lo se ainda estivéssemos naquele Março de 2013, quando claudicou a tentativa de repetição da grande jornada de contestação de 15 de setembro de 2012 ao governo de Passos Coelho que quase parecera o início de um movimento insurrecional equivalente ao da tomada do Palácio de Inverno em 1917. Os poucos milhares de resistentes, que percorram as ruas de Lisboa com uma expressão derrotada no rosto, eram gémeos de Margherita e de Giovanni, que veem a realidade transformar-se nos escombros de todas as suas remanescentes ilusões, ademais agudizadas pela iminente morte da respetiva mãe.
Felizmente vi «Minha Mãe», quando os nossos rostos já espelham as expectativas de um tempo novo, que classificar de pesadelo assustador esse passado em que nos víamos tão desesperançados.
Mas o filme de Moretti levanta questões, que as últimas semanas de campanha eleitoral se me colocaram quase todos os dias: quando sentimos abúlicos, desinteressados ou até agressivamente reativos os que deveriam estar mais interessados nesse tempo novo, como estabelecer com eles o canal assertivo de comunicação, que o antigo cinema militante nunca conseguiu verdadeiramente descobrir? Como convencê-los do seu interesse objetivo em que ganhe um ou outro candidato à presidência da República?
Enquanto realizador de filmes militantes Margherita não consegue compreender sequer as variáveis de que se compõem as suas vivências individuais quanto mais criar na tela do cinema uma história de mentalização dos oprimidos para as razões e efeitos da globalização, que os desemprega e miserabiliza?
Há, é claro, a questão da catarse do luto como tema preponderante de um filme, que se desenha em três planos distintos: o da história do filme, o das contradições na equipa de filmagens e o do relacionamento dos dois irmãos com a mãe quase moribunda. Singularmente, por me ver protagonista de história semelhante, poderia ser este último o que melhor atrairia a minha atenção. Mas, porque esse luto já foi feito por antecipação há muitos anos, o filme de Moretti questiona-me , sobretudo, quanto aos impasses atuais entre uma esquerda disposta a retomar a flâmula de mudança do mundo e a sua base social de apoio, mormente os jovens, que se alhearam desse imperativo histórico. E as respostas tardam em surgir...

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