quarta-feira, maio 20, 2015

DIÁRIO DE LEITURAS: «Felicidade» de Will Ferguson (III)

E se um livro de autoajuda fosse uma enorme vigarice, mas se mostrasse capaz de alterar completamente os comportamentos dos que o leem de forma a que as industrias do tabaco e do álcool ou as clínicas de desintoxicação ameaçassem falência?
O protagonista do romance de Will Ferguson está quase a confrontar-se com o dilema de reagir a esse cenário apocalítico muito embora comece por seguir os conselhos do manuscrito e multiplique por mil os 2000 dólares investidos na Bolsa, vendo-se por isso sujeito a uma investigação do FBI: “A intempestiva riqueza de Edwin estava agora suspensa num limbo. A investigação podia levar anos; podia nunca mais voltar a ver o dinheiro. Pelos vistos, tinha recentemente surgido toda uma vaga de milionários, quase da noite para o dia, todos num raio de quinze quilómetros da cidade e todos com o mesmo modus operandi. Tinham conseguido escapar por entre as malhas, feito fortunas numa semana e sugado milhões - quando não milhares de milhões - através de buracos inócuos na legislação bancária.” (pág. 122)
Edwin vê-se, assim, obrigado a retomar à rotina do trabalho de editor com o patrão, o sr. Mead, a incumbi-lo de lançar um novo livro de autoajuda para pessoas obesas em que se propusessem as virtudes de uma dieta de … carne de porco frita!
Mas esse projeto nem arranca, porque «O que Aprendi na Montanha» começa a bater todos os recordes de vendas e a exigir sucessivas reedições. E desmentindo o seu ascetismo, o autor, Tupak Soiree, acede a participar em todas as entrevistas e outras iniciativas relacionadas com o lançamento e distribuição do seu livro … conquanto lhe paguem 5 mil dólares por sessão.
“Quando Tupak apareceu em ‘Oprah’, cidades inteiras paralisaram. A intensa publicidade que precedera a estreia pública do recluso autor pôs a Cidade Ventosa em excesso de atividade mediática. Os jornais e os programas de rádio, em que os ouvintes participavam, não queriam falar de outra coisa. Dava para pensar que o Dalai Lama tinha aparecido lado a lado com Cristo em pessoa.” (pág. 165)
Atónito com o circo em que se vê a participar, Edwin compreende a veracidade ambígua da personalidade de Tupak vendo-o pelo prisma do mal que anda a causar.
Depressa suspeita que Tupak nunca foi um asceta, imaginando-o com os conhecimentos de informática necessários para a criação de algoritmos capazes de plagiarem milhares de livros de autoajuda e criarem a receita mais eficaz para construir um bestseller.
Já não lhe bastavam os pensamentos inquietos e Edwin vê-se raptado por três gangsters a soldo de todos quantos perderam milhões de dólares com os novos paradigmas dos comportamentos coletivos, dando-lhe o prazo de uma semana para corrigir os danos causados pelo lançamento do livro.
 

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