quinta-feira, junho 23, 2011

Filme: UM ANO MAIS de Mike Leigh

Há filmes desconfortáveis, mas que nos atraem pela intensidade dos seus personagens, muito mais próximos do que julgaríamos possível.
Ao abordar a solidão e o envelhecimento de um conjunto de personagens em torno de um casal, que atingiu a serenidade da idade madura, Mike Leigh remete-nos para as nossas próprias ansiedades, quanto ao que viveremos nessa fase crepuscular da vida.
Imitaremos Tom e Gerri na forma cúmplice como pacificaram as suas tensões partilhando trabalho na horta ou os convívios com os amigos que os visitam? Ou seremos confrontados com a solidão de Ronnie, cuja súbita viuvez o deixa apático e sem objectivos para a vida?
Não faltam solitários neste filme de Mike Leigh: desde a patética Mary, incapaz de compreender a improbabilidade de um recomeço, mesmo que compre um carro em segunda mão e volte a conduzir até ao rotundo Ken, que bem gostaria de encontrar alguém com quem vencesse o tédio dos dias, mas cuja boçalidade impede de ser sequer considerado uma possibilidade pela mais desesperada das descomprometidas.

E, no entanto, todos os personagens mais velhos já foram jovens, que tinham dançado ao som de Elvis ou dos Beatles e haviam experimentado erva em tempos de enormes ilusões quanto ao que fariam. Parecer-lhes-ia então tão distante essa derradeira fase da existência, quando só sobra amargura e silêncio!
Quanto aos mais novos também sobram incertezas: Joe, o filho de Tom e de Gerri, bem encontra uma animada Katie, mas será ela a candidata ao mimetismo do tipo de relação conjugal, que testemunhara nos pais? E quanto a Carl, filho de Ronnie, as dúvidas convertem-se em certezas: há algo de psicótico na forma como se apresenta no funeral da mãe e como se despede do velório subsequente.
Sucedem-se quatro estações, e Mary parece em vias de perder completamente o juízo, afundada nas suas depressões.
Mas não é esse o estado mais óbvio da maioria das pessoas que nos rodeiam e vivem sujeitas aos mesmos tipos de frustrações e de medos perante um futuro aonde só a morte é certa, mas aterrador o caminho que até ela leva?

Sem comentários: