Ronald Schernikau sonhou toda a vida ir viver para a República Democrática Alemã para cumprir o sonho de viver numa sociedade comunista. Mas, quando o consegue em definitivo, em Setembro de 1989, o Muro de Berlim está a poucas semanas de ser derrubado. E, quando morre de Sida em 20 de Outubro de 1991, Ronald já sabe que o seu sonho se esfumou por completo.
Mas a sua notoriedade ficava garantida apesar de, em vida, só ter publicado três livros, por ser o símbolo de um intelectual insubmisso perante o sistema capitalista, que execrava.
Se estivesse vivo ele contaria, actualmente, 50 anos, já que nascera em 1960 em Magdeburgo, nessa Alemanha comunista aonde desejaria voltar. Mas, ainda é bebé, quando o pai foge para o lado ocidental, deixando-o com Ellen, essa enfermeira, que também nunca renegará os valores políticos da sociedade em que crescera depois da Segunda Guerra Mundial.
Será apenas porque deseja voltar a viver com o homem amado, que ela acede a meter-se na mala de um automóvel com o filho de seis anos e a passar a fronteira proibida. Para ter a maior desilusão da sua vida: esse marido tão desejado já tem outra família e nada quer dos que deixara no passado. Ciente de ter feito a opção errada, Ellen jamais deixará de lamentar a sua opção, até porque a vida de enfermeira na RDA lhe garantia regalias bem maiores do que as usufruídas na Alemanha Ocidental. Para o filho, a quem se liga ainda mais intensamente, não deixará de transmitir essa nostalgia do paraíso perdido.
Muitas vezes os filhos revoltam-se contra os valores inculcados pelos pais, mas esse não é o caso de Ronald, que adere, muito novo, ao Partido Comunista Alemão. Mas outra originalidade o distingue dos seus colegas de liceu: além de comunista, é assumidamente homossexual, escrevendo um romance de grande sucesso, quando ainda só tem 16 anos, «Kleinstadnovelle» sobre os amores entre dois rapazes adolescentes.
Acabado o liceu parte para Berlim, aonde a comunidade gay o recebe de braços abertos. Ronald Schernikau é então um jovem tão brilhante, quanto arrogante nas suas convicções. Que não deixava de adorar os espectáculos de variedades pimba da televisão leste-alemã.
De um e do outro lado do Muro todos o cortejam para entrevistas televisivas ou para conferências. Mas esgotado o dinheiro ganho com o primeiro livro, ele tem grande dificuldade em encontrar editor para o que se lhe segue. Sem dinheiro, acaba por ir viver para um apartamento sórdido.
Em 1986 inscreve-se na Universidade de Leipzig, apoiado por alguns dos maiores escritores comunistas de então. A bolsa de estudos e o apartamento confortável, que lhe é atribuído, reforçam-lhe as convicções quanto à sua escolha decisiva: ele quer ganhar a nacionalidade do país aonde nascera. E que, agora, lhe permitia passar o tempo a fazer o que mais gostava: ler e escrever…
Não era, porém, um seguidor do regime de Honecker: através das suas críticas, ele esperava que se corrigisse e melhorasse, adequando-se a um tipo de regime donde as pessoas não tivessem vontade de fugir, aliando o melhor do que existia nos dois lados do Muro.
Em 1 de Março de 1990, quando muitos dos presentes já só pensavam em virar a casaca, ele tem uma intervenção corajosa no último congresso dos escritores leste-alemães.
Não tardará a confirmar as suspeitas de ter contraído sida. Nos meses, que se seguem, ele vive uma verdadeira corrida contra a morte para concluir a sua obra maior: «Legende». Romance sobre a sua vida e o seu tempo, que só será publicado oito anos depois.
Sem comentários:
Enviar um comentário