segunda-feira, julho 11, 2011

Livro: VOO NOCTURNO de Antoine de Saint-Exupéry

Saint-Exupéry publicou Voo Nocturno em Dezembro de 1930, ganhando o Prémio Fémina no ano seguinte e tornando-se um dos primeiros romances a integrar a conhecida colecção dos Livres de Poche (é o nº 3).
A acção passa-se na América do Sul, quando se vivem os tempos heróicos da aviação comercial. Saint-Exupéry conhecia bem essa realidade, porquanto fora, no ano anterior, o director da Aeropostal da Argentina, de alguma forma o mesmo posto cumprido por Rivière, o protagonista da história.
O principal objectivo de Rivière é o de provar que o avião é um meio de transporte mais rápido do que o comboio para o transporte do correio desde que os seus pilotos voem durante a noite, ganhando-se assim o tempo eventualmente perdido durante o dia.
Fabien, um desses pilotos, voa entre o extremo sul do país e a capital, quando é apanhado por uma violenta tempestade, que o impedirá de alcançar o seu destino. O seu sacrifício é o preço do sucesso da estratégia de Rivière, que incute nos seus homens o arrojo perante as vicissitudes, não temendo a morte e levando até aos limites o cumprimento da sua missão.
Eles deverão agir como se ela tivesse mais valor do que o da própria vida humana: o correio é sacralizado e deve sempre chegar a horas ao seu destino. É essa a responsabilidade dos pilotos, o sentido do que fazem.
Para Rivière é indiferente, que considerem ou não justa essa perspectiva. Por isso é inflexível com o velho mecânico a quem despede após vinte anos de bom desempenho por ter cometido um erro na montagem de um motor ou arrogante para com o piloto, que chegou a vacilar no meio de uma tempestade.
Mas o confronto com a mulher de Fabien, que lhe vem exigir notícias sobre o seu desaparecido marido, perturba-o, mesmo se nada lhe chega a dizer de concreto. Mas ela sai dali a compreender quão vã é a mitigada esperança com que ali chegara.
Para Rivière existe uma incompatibilidade entre o amor e o dever por muito que, um e outro, façam sentido. E, apesar da perda de um aparelho e da respectiva tripulação - o que para ele constitui dolorosa derrota - ele não suspende nenhum voo para que a causa dos voos nocturnos não seja equacionada.


O testemunho de Saint-Exupéry sobre a vida dos pilotos de linha regular está despojado de qualquer literatura, retratando uma experiência de vida e como ele e os colegas estavam prontos a renunciar aos interesses individuais em nome de uma causa legítima.
A obra serve para definir dois tipos de homens: o chefe que forja vontades e o indivíduo incumbido de cumprir ordens aceitando os riscos inerentes à sua actividade. Entre uns e outros não existem relações de patrão e de escravo, mas de homem para homem, consistindo a liberdade em cada qual se mostrar submetido ao seu conceito de dever. É no respeito por esse constrangimento que tomam consciência da grandeza e através da acção, que estão em condições de a interligar a esse sentido do dever. Essa é a conclusão lógica do livro e que anuncia os princípios em que Saint-Exupéry fundamentará a sua ética tão presente nas suas obras posteriores.

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