Quando se trata de documentário sobre música erudita sabe-se que a assinatura de Bruno Monsaingeon é sinónimo de qualidade garantida. Como o demonstram os seus antológicos filmes com Glenn Gould.
Em 2003 ele assinou um filme com o maestro russo Gennady Rozhdestvensky, que é aliciante na forma como ele expõe a sua arte.
Logo de início ele lembra as três coisas em que Tolstoi não acreditava: na medicina, nas tarefas escolares e na direcção de orquestra. Ora, não é pelos movimentos dos braços ou pelos olhares, que Rozhdestvensky assume a direcção das orquestras: é pela irradiação de um estado de espírito algo inexplicável, que ele se define.
Nos anos vinte o regime soviético testou uma orquestra sem quem a dirigisse, mas era algo de falacioso, porquanto o primeiro violino acabava por assumir essa função. Ora, num artista, que nem sempre foi bem tratado por tal regime (era tido como demasiado formalista devido à sua preferência pela música contemporânea) é insuspeita a opinião quanto à preferência por uma certa forma de ditadura: ao contrário da que é estúpida na sua repressão odiosa, há mérito na condução persuasiva, aquela que faz crer ao dirigido a capacidade de ter livre arbítrio, mas em que as suas potencialidades são orientadas pelo director.
Atitude igualmente interessante a dele perante os ensaios das orquestras que dirige: para além de só os iniciar depois de ter as partituras na cabeça o que procura não é a reprodução do que virá a ser o concerto, porquanto deverá guardar algo de surpreendente, de improvisação para esse momento de particular intensidade emotiva.
Mas o que mais surpreende em Rozhdestvensky é a sua mímica, muito diferente da dos demais maestros: ele dá colorido ao que a orquestra toca, complementando-lhe a leitura. E aos alunos a quem procura transmitir a sua forma de interpretação no que os questiona é na essência mesma do que dizem e fazem…
Pouco conhecido no Ocidente, Rozhdestvensky muito fica a dever à inteligência com que Monsaingeon o retrata.
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