sexta-feira, dezembro 04, 2020

(NM) Memórias de Operários orgulhosos e dispostos a lutarem pelos seus interesses

 

1. Curiosas as fotografias dos alvores da arte descoberta por Niepce e desenvolvida por Daguerre. Quando acedemos às da Belle Époque é sempre curioso constatar as colhidas em famílias operárias, até então quase sempre ausentes das iconografias visuais. Vivendo nos limites da subsistência, ganhavam justificada autoestima ao vestirem os melhores trapos para arvorarem poses muito sérias perante o fotógrafo. No fundo não diferiam muito dos burgueses, que trajavam fraque e cartola e apresentavam-se com vistosos bigodes enquanto, ao lado, as esposas mui virtuosas se apertavam o mais possível nos imprescindíveis espartilhos. Uns e outros queriam dar de si a melhor imagem possível!

Muitos anos passariam até se aceitarem poses descontraídas como legado visual dos protagonistas aos vindouros, que hoje as continuam a olhar com inesgotável curiosidade.

2. Vantajosa a evolução nas aparelhagens sonoras dos carros modernos, que dispensaram cassetes e CD’s substituindo-as por pens com milhares de horas de músicas. Nestes últimos dias tive a grata surpresa de me reaparecer um disco de Pete Seeger que, seguramente, já não ouvia há uns bons trinta ou quarenta anos e ficara esquecido nos recônditos meandros da memória. Gravado em 1941 com a cumplicidade de Woody Guthrie e dos demais Almanac Singers, é um álbum maravilhoso em que o «Gloria, Gloria Aleluia» vê os versos religiosos substituídos pela bem mais exaltante «Solidarity Forever» e não faltam hinos às lutas sindicais, homenageando-se Joe Hill, questionando-se de que lado se está na luta social ou insultando os esbirros dos patrões recusando o medo por sobressair o orgulho de se pertencer à organização representativa dos trabalhadores.

É uma América dum passado remoto a que vem ao de cima nesta audição, quando gente heroica pretendia pôr fim à sua exploração, mesmo enfrentando os perigos mais inquietantes. Convenhamos que o anticomunismo do macartismo e as ilusões consumistas deram cabo da consciência de classe. Mas é comovedor lembrar que a América também já foi assim... 

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