quinta-feira, junho 27, 2019

(DL) O Caminho Imperfeito de José Luís Peixoto


Nas primeiras páginas surge notícia de um caso macabro: jovens norte-americanos, em turismo pela Tailândia, foram a um mercado de Banguecoque, compraram partes de corpos humanos e quiseram enviá-los para Las Vegas, identificando-os como brinquedos para alguns amigos.
O livro de José Luís Peixoto versa sobre as suas experiências nesse país do Extremo Oriente, que os portugueses conheceram como Sião na época dos descobrimentos e que mantém apreciável quota de exotismo a par da vertente cosmopolita destinada ao usufruto dos turistas ocidentais. Eu que do país só conheci o aeroporto numa madrugada em que o avião para Tóquio teve de fazer aí escala e aproveitei as duas horas de paragem para pousar os pés em terra firme, não me senti tentado a lá voltar. Pela imundície, pela miséria, pelo obrigatório respeito a uma injustificável figura imperial e muitas outras razões acrescentadas pela leitura deste caminho imperfeito.
Peixoto não se fica por ali, porque também evoca as várias visitas à cidade do Nevada para onde os macabros despojos deveriam ter sido enviados acaso não tivessem sido confiscados logo à partida. E esse paralelismo entre Las Vegas e Banguecoque, afinal não tão diferentes quanto suporíamos à partida, perpassa todo o livro, que assinala o nosso país como outro vértice do triângulo, porque, amiúde, Peixoto convoca as memórias relativas a diversas fases do seu passado.
Há personagens incomuns, tatuagens em abundância e um olhar sobre as diversas geografias que as banaliza, as justapõe umas sobre as outras sem nelas sublinhar o que de genuíno possam ainda conter. Às tantas, e numa altura em que aumenta o número dos que associam as viagens de avião à aceleração das alterações climáticas, fica a questão de saber se valerá mesmo a pena buscar vivências assim tão longe de onde se está...

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