sábado, janeiro 27, 2018

As Partes do Todo (XIV) - 27 de janeiro de 2018: ruralidades

Nos anos 60 e 70 organizaram-se grandes investigações coletivas e pluridisciplinares por todo o território francês. Uma delas incidiu numa pequena aldeia da Borgonha com quatrocentos habitantes. Concretizado por quatro jovens mulheres, que integravam o Laboratório de Antropologia Social dirigido por Claude Lévi-Strauss e Isac Shiva, esse trabalho decorreu entre 1967 e 1975 multiplicando entrevistas sucessivas com quem ali vivia, repetindo-as ano após ano para ir constatando as alterações de valores e de opiniões, que os tempos iam impondo.
Tina Jolas, Marie-Claude Pingaud, Yvonne Verdier e Françoise Zonabend instalaram-se em Minot e começaram a recolher informações nos arquivos comunais, mas depressa compreenderam a importância de privilegiarem o contacto direto com os aldeões, que se tornaram seus informadores privilegiados de quanto pretendiam coligir.
As quatro antropólogas igualmente concluíram sobre a vantagem de coletivizarem o esforço, prescindindo da inicial abordagem individual, trocando entre si todos os dados recolhidos, que lhes permitissem depois organizá-los num apreciável conjunto de publicações em forma de livros.
De um ponto de vista teórico, a investigação em Minot revelou-se inovadora por ter sido orientada pelos métodos já bastante experimentados pela antropologia social em contextos exóticos e que haviam incidido sobre a parentalidade, o sistema matrimonial, a memória familiar, os espaços dos rituais ou as figuras tutelares.
Construíram assim uma informação aprofundada sobre uma sociedade rural prestes a desaparecer em que as mulheres - enquanto esposas, mães ou filhas - viviam subjugadas por um sistema patriarcal que as sobreexplorava sem escrúpulo. Microssociedade fechada, avessa aos estímulos exteriores, até os casamentos eram contratualizados com primos suficientemente distantes, para não suscitarem grandes riscos de consanguinidade, mas conhecidos o bastante para não serem tidos como completamente desconhecidos.
Ao conhecer esta investigação científica podemos concluir quão semelhantes seriam as realidades francesa e portuguesa em épocas semelhantes. Porque a mesma desconfiança perante quem vinha de fora da comunidade e a consideração da mulher como ser privado dos direitos reconhecidos aos homens, aproximaria por certo as culturas rurais de ambos os países nesse passado não tão remoto quanto poderíamos imaginar.

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