quinta-feira, abril 09, 2015

DIÁRIO DE LEITURAS: «Os Cadernos de Platão» de Peter Ackroyd (3ª parte)

A visita de Platão à caverna onde reencontrara o mundo da Época da Toupeira - aquela que corresponde ao nosso presente - vai impressionar profundamente o respeitado orador do século XXXVIII. Ele compreende, enfim, quão importante era o “tempo” para os antepassados de mil e setecentos anos atrás: “O tempo emprestava-lhes um sentido de progresso e de mudança, assim como lhes dava a perspetiva e uma indicação de distância. Permitia-lhes sentir esperança e também esquecimento.”  (pág. 120)
O filósofo compreende, assim, que tais antepassados não tinham o medo face à mudança, que era tão característico dos seus contemporâneos. Que, por isso mesmo, o querem sujeitar a julgamento, porque as novas ideias por ele transmitidas à juventude só a poderia corromper. Sobretudo, porque ele incita quem o ouve a tudo questionar.
No tribunal, Platão exalta as qualidades do Povo da Toupeira: “Eles eram verdadeiramente livres, uma vez que acreditavam que controlavam os seus próprios destinos. Pensa nas nossas vidas agora. São vazias, precisamente porque vocês querem que elas sejam isentas de significado. Vocês acreditam que não há significado.”  (pág. 135)
«Os Cadernos de Platão» confirmam ser o que já sobre ele suspeitáramos desde o início: posicionando-se num futuro distante, procura cumprir um dos objetivos fundamentais dos melhores romances de ficção científica, que é questionar o nosso tempo atual em comparação com uma utopia ou, neste caso, uma distopia,  tomada como bitola.
Já pressentindo a inevitabilidade da sua condenação, Platão dá largas à imaginação e interpreta de forma ainda mais temerária a sua interpretação sobre quanto viu na Caverna: “Talvez eu estivesse enganado. Eu tinha sentido e acreditado que estava a viajar debaixo da Terra, mas isso pode ter sido a minha própria falta de imaginação. Talvez eles estejam todos à nossa volta, mas não nos consigamos ver uns aos outros. Agora estão-se a rir novamente. Confirmam o meu ponto de vista. Pode ser que nos recusemos a vê-los. Ou eles se recusem a ver-nos a nós. Não tenho a certeza. De algum modo ficámos todos separados uns dos outros. Mas eu sei o seguinte: o nosso mundo e o mundo deles está interligado!” (pág. 159). 

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