sábado, abril 11, 2015

DIÁRIO DAS IMAGENS EM MOVIMENTO: «As Virgens Suicidas» de Sophia Coppola (1998)

Para o seu primeiro filme enquanto realizadora, Sofia Coppola optou por adaptar o romance de Jeffrey Eugenides, um dos mais interessantes escritores norte-americanos do nosso tempo.
Década de 70. Numa pacata vilória do Michigan, as louras e evanescentes irmãs Lisbon, suicidam-se umas a seguir às outras.
Anos depois essa estranha tragédia é evocada pelos rapazes, seus vizinhos, que viviam fascinados pelo sortilégio delas emanado. À distância, e quase se sentindo inconsoláveis, recordam as cinco raparigas como autênticas deusas inatingíveis.
É essa memória polifónica e exaltada, que confere originalidade ao filme, ao acumular reminiscências, divagações, fantasmas e recordações reconstruídas. O resultado é uma voluptuosa elegia decorrida entre o primeiro beijo em abril e a consumação da tragédia em outubro.
Entre a primeira tentativa de suicídio de Cecília, que era a mais nova das irmãs, e a morte de Lux, a primogénita, não existe propriamente uma intriga, mas sobra inquietação, fantasia, inesperado, e até burlesco.
Qual é o problema das irmãs Lisbon? Provavelmente a severidade dos pais interpretados por James Woods, no papel de um tímido professor de matemáticas, e Kathleen Turner, no de uma robusta e intransigente mãe de família, sempre de olho no comportamento das filhas.
Estamos na época em que o puritanismo evangélico da pequena burguesia branca procurava asfixiar as tentações sexuais dos jovens. E em que o jornalismo de sarjeta estava bem presente através dos repórteres estacionados à porta da família como abutres, à espera de novo drama que possam explorar até ao paroxismo.
A ameaça, que paira continuamente sobre as irmãs, consegue livrar Sofia Coppola de se ater às convenções estúpidas habitualmente adotadas pelos filmes sobre adolescentes. Mesmo que, aqui e além lá, aconteça a ridícula procissão dos rapazes a buscarem as raparigas para o baile do fim do ano, a eleição do rei e da rainha do evento ou a perda da virgindade no estádio vazio.
Se essas cenas são convocadas é porque nelas tudo cintila com o brilho intenso do que se revela irrepetível. E quando os pais, confrontados com a irreverência da primogénita, decidem encarcerar definitivamente as filhas em casa, o filme ainda se torna mais perturbador: em torno de um gira-discos e de um telefone, as irmãs comunicam à distância com os rapazes através de algumas canções românticas, fazendo das tardes languidas uma espécie de mitologia da adolescência.
Sofia Coppola parece não ter querido outra coisa: voltar a mergulhar nas delícias e suplícios de uma idade impossível, mesmo que com a distância proporcionada pelo cinema. Por isso quase parece fazer do quíntuplo suicídio uma espécie de comédia.
Pela voz dos narradores, que se tornaram em nostálgicos sobreviventes desse passado, as coisas mais belas são sempre as que nele ficaram irremediavelmente perdidas. Mesmo que a atração exercida pelas irmãs Lisbon deva menos à sua beleza, aos cabelos louros de todas ou à suposta inocência. Terá sido o suicídio a torna-las inesquecíveis...
Estamos no retrato de uma América sórdida e hipócrita, em que a morte das adolescentes, ao torna-las imateriais, também as promove à condição de mitos. 

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