quarta-feira, março 25, 2015

DIÁRIO DE LEITURAS: «Adam Runaway» de Peter Prince

Não se desse o caso de se tratar de um romance passado em Lisboa em vésperas do terramoto e não seria prosa, que merecesse grande atenção. Mas torna-se bastante interessante a forma como a descreve, sedutoramente cosmopolita, na perspetiva de um jovem inglês aqui chegado com a ilusão de singrar na atividade comercial.
Há também um aspeto complementar de grande interesse: a denúncia do fanatismo antissemita do rei D. João V, que, mesmo adoentado, jamais perdia a ocasião de ver uns quantos cristãos-novos arderem nas fogueiras do Rossio.
Adam transporta consigo um pesado fardo: o pai, Matthew, ocupara posição proeminente na City até se deixar envolver em negócios especulativos, que tinham resultado na falência e no suicídio. Deixando a mãe e a irmã a viverem miseravelmente na província inglesa, Adam deseja enriquecer tão rapidamente quanto possível para lhes devolver uma qualidade de vida minimamente digna. Conta para tal com a ajuda do tio Félix, que fora aliciado pelo irmão para os mesmos investimentos enganadores e neles quase deixara a fortuna acumulada na nossa capital do Império.
Durante umas semanas a vida parece sorrir a Adam, que começa a ser aceite na pequena comunidade  inglesa e até se enamora de uma das suas mais prometedoras debutantes, Gabrielle.
Mas, inocente, depressa cai em desgraça, acusado de ter conversas inconvenientes com a adolescente e de ter ludibriado as contas do tio, conforme fora denunciado pelo capataz Bartolomeu Gomes, na realidade um refinado canalha.
Sem dinheiro sequer para regressar a Londres, resta a Adam ajudar o velho Hutchinson e a sua filha, Beatriz da Fonseca, a vender reproduções de santos pelas ruas de Lisboa. E é nessa aproximação a esses vizinhos da casa de hóspedes onde se alojara, que chega ao leito da já madura senhora a quem, sem o saber engravida.
É já em Londres, que Adam irá conhecer esse filho de cuja educação se encarregará, trazido pela prestável Gabrielle. Ela conta-lhe parte da história, por ele depois confirmada em breve regresso a Lisboa: Beatriz vivera toda a gravidez nas enxovias da Inquisição e acabara queimada por se recusar a renegar a religião recebida de sua mãe.
Nessa altura, e graças ao ouro que contrabandeara para Londres pertencente ao antigo senhorio, também ele perseguido pelo mesmo Santo Ofício, Adam já conseguira recuperar o estatuto do pai na City e até albergar consigo a mãe, a irmã e a família do tio Félix, a quem as vigarices de Bartolomeu Gomes, também tinham redundado na falência.

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