sábado, dezembro 12, 2015

ARTES: um ganha prémios, o outro muito não...

Na viragem do milénio, quando me tornei no marinheiro que perdeu as graças do mar, fui obrigado a assumir a vocação de diretor de uma grande empresa na área da manutenção de edifícios. Foi por essa altura que passei a contar com um subempreiteiro chamado Manuel Brandão, um homem simples, mas incrivelmente talentoso, que muito me ajudou a ter sucesso num conjunto de projetos com que comigo colaborou - construção de restaurantes e de escritórios de raiz, obras de carácter infraestrutural, etc. - de garantido sucesso.
Os anos tornaram-nos amigos e foi assim que lhe descobri a vertente artística. Não só pelo facto de lhe ter sabido a colaboração direta com um dos mais mediáticos artistas plásticos nacionais (que concebia as obras, dava-lhas a fazer, e depois assinava-as no fim como sendo da sua autoria!), mas também por lhe surpreender peças da própria autoria em sua casa.
Igualmente versada nas artes, a minha mulher tentou investigar mais seriamente o seu processo criativo. Embora só se tendo dotado do 9º ano de escolaridade através do nunca por demais elogiado programa das «Novas Oportunidades», o Manuel Brandão explicou-lhe o conceito dos seus trabalhos com uma simplicidade, mas ao mesmo tempo com uma perspetiva aprofundada do pretendido, que nos deixou impressionados.
Nessa altura - estávamos na festa de aniversário do neto desse amigo - falámos-lhe de Rui Chafes. Por causa dos trabalhos em ferro, mas também pelo uso intensivo das mesmas ferramentas criativas: a soldadura, a moldagem, a interação com outros materiais para conseguir um resultado orgânico. É que, embora o desconhecesse, esse Brandão não estaria muito distante do tipo de obras do agora galardoado Prémio Pessoa, tendo em conta uma das principais características do artista: a surpreendente leveza das suas peças, mesmo quando lhes adivinhamos o peso dos respetivos materiais.
Há, sobretudo, uma peça que julgo pertencer à coleção do CAM - pelo menos é aí que a temos mais amiudadamente encontrado! - que quase parece flutuar como se para ela não funcionassem as regras da gravidade. Talvez efeito prático da conceção filosófica, que o escultor incorporou na sua obra.
Essa será, porventura, a grande diferença entre o escultor e hábil artesão: o Brandão investe nas suas peças a filosofia de quem aprendeu tudo na escola da vida. Rui Chafes consegue associar à obra toda uma cultura aprendida nos livros, nos bancos de escola e no conhecimento prático do que outros artistas conceberam e estão a criar.
Mas, embora diferente, voto igual admiração aos dois artistas...

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