A opção não é nova, se nos lembrarmos do Sunset Boulevard do Billy Wilder, quando, logo à partida, percebíamos que a história de Norma Desmond seria contada pelo amante, um argumenista afogado na sua piscina.
Em Indignação o Philip Roth usa artifício semelhante para contar a história de Marcus Messner, um jovem judeu de Newark, que vai estudar para o Ohio e aí conhece quem acabará por lhe determinar a morte precoce.
Para um empedernido ateu não haverá nenhuma existência para além do momento do finamento, mas Roth coloca uma questão com alguma piada: e se ficasse de nós a memória, perdida num limbo intemporal em que tudo voltaria a ser equacionado para procurar entendimento sobre o que se acertou ou errou? O que deixaria para pessoas como a Elza uma questão pertinente: onde estaria essa memória algures perdida na intima e perdida guerra com o cérebro disfuncional? Quem me dera ter a resposta!
Noutra leitura, concluída por estes dias, tive o comissário Guido Brunetti a concluir mais um caso sem conseguir a devida punição do(s) assassino(s) de uma vítima merecedora da sua comovida consideração. Em A Rapariga dos seus sonhos a morta é uma miúda cigana de dez anos sujeita a uma vida terrível - já sexualizada na comunidade, como o indicia a gonorreia detetada na autópsia, e forçada a ganhar o sustento da família nos assaltos a casas com o gangue de cúmplices da mesma idade.
Colateralmente Donna Leon denuncia a corrupção na cidade dos doges, que a fazem tão pouco estimada nessa Itália para onde há muito foi viver, e exemplar demonstração de uma desigualdade gritante entre os muito ricos e os que tão pouco têm...
Leituras ligeiras num e noutro caso. Mas com muito que se lhes diga se as ponderarmos para além do nível mais básico da sua apreciação.