domingo, fevereiro 04, 2024

Histórias Exemplares (IX) - Paradoxos da História

 

1. No derradeiro episódio televisivo da História sobre o colonialismo português em África, Fernando Rosas abordou o inegável sucesso da integração dos retornados nos cinco anos subsequentes à Revolução dos Cravos.

Paradoxalmente viram-se por ela privilegiados com apoios, empregos e créditos bancários apesar de, em significativa dimensão, a maldizerem, a pretenderem manchar com as piores diatribes e servindo (ainda hoje!) de tropa fandanga à extrema-direita.

Buscando explicação para esse sucesso, o historiador aventa a forte probabilidade de boa parte dos menos instruídos terem regressado às terras de origem e aí contribuírem para o dinamismo económico, que nelas se verificou. E os dotados de melhor formação, normalmente mais novos, ficaram-se pelos centros urbanos onde aproveitaram o crescimento do setor empresarial do Estado, mormente a nacionalização da banca, para ocuparem postos de trabalho para os quais passaram a ser preferidos.

Embora não o diga explicitamente, Fernando Rosas deixa transpirar a constatação de uma inequívoca ingratidão, que muitos retornados alimentaram por uma Revolução, que lhes propiciou a adaptação a um mundo novo do qual, com a ilusão colonialista, estavam apartados.

2. Foi das piores coisas, que poderiam ter acontecido à esquerda mundial: a ilusão de uma Terceira Via, que “amansasse” os radicalismos socialistas e a fizesse trilhar as bem menos turbulentas ondas da “social-democracia”. Tony Blair representou essa faceta de uma falsa esquerda completamente rendida às ideologias das direitas e aos interesses dos Estados Unidos. O clip em que surgiu como o amestrado cãozinho de George Dabliú Bush era explicito quanto a essa realidade.

Em Uma Verdade Incómoda, romance de John Le Carré, que aborda esse período da história britânica, vai mais longe: Fergus Quinn, o ministro dos Negócios Estrangeiros, escocês como Gordon Brown, está mais do que comprometido com a extrema-direita norte-americana e a indústria do armamento, que a financiava.

Estou curioso em saber como o mestre da literatura de espionagem vai desenvolver uma trama ficcional numa conjuntura histórica tão peculiar e de que tão pouco se conhece quanto aos pormenores mais obscuros. 

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