domingo, janeiro 10, 2010

Um museu parisiense

Há uns anos atrás o Frédéric Ferney fez uns programas bastante interessantes no canal ARTE nos quais se encontrava com um conjunto de artistas no cemitério do Père Lachaise para, durante menos de meia hora, perorarem sobre a morte. A ideia de base até era ainda mais curiosa: esse convidado teria acabado de morrer e Ferney seria o anjo-guia, que o iria orientar nos primeiros passos pela definitiva não-existência.
Pelo menos em importância terá sido esse o meu primeiro encontro em termos de imagens em movimento com aquele que é considerado um dos mais interessantes locais visitáveis da cidade de Paris: pela estatuária ali representada, aonde se encontram alguns dos melhores exemplos da Art Déco, pelo simbolismo associado a alguns dos seus ilustres hóspedes (desde o emblemático Jim Morrison a Rossini, de Balzac a Edith Piaf).
Um artigo de Luís Maio no «Fugas» desta semana acrescenta duas outras informações singulares: para além da fauna macabra expectável num cemitério existe muito outra a começar pelas três centenas de gatos, pelos corvos e muitos outros pássaros, pelos lagartos e insectos, que justificariam bem qualquer documentário sobre a vida animal em ambiente urbano.
A outra informação decorre da razão histórica para a criação do cemitério do Père Lachaise: «em finais do século XIX, os cemitérios existentes dentro de paris estavam superlotados, tanto que o dos Inocentes chegou mesmo a rebentar.
Rolaram cadáveres pelas ruas e o seu cheiro putrefacto chegou às imediações de Les Halles, então o mercado central da cidade, o que naturalmente disseminou o horror entre a população.
No dia seguinte ao sórdido aceidente, Napoleão anunciou quatro novos vcemitérios, o maior dos quais era justamente o de Leste.».
É claro que chegado a este tempo em que até os padres pedem para ser cremados - aconteceu a semana transacta em Setúbal! - os cemitérios estarão condenados a prazo: a eliminação dos corpos reduzindo-os a cinzas será solução progressivamente normalizada, transformando tais locais de culto (como ainda o são por exemplo no México) em campos de ruínas mais ou menos abandonados.
O Père Lachaise já vai mais à frente: nos dias de hoje pode ser tido como mais um dos museus da cidade luz.

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