Ao ouvir Gouveia e Melo a elogiar Sacadura Cabral e Gago Coutinho num making of da série a eles dedicada pela RTP confirmei-o como homem velho, desfasado deste tempo de “heróis” cada vez mais desajustados da realidade e paradigmas de ilusões, que disso não passam. O que não admira dada a conhecida propensão para se promover enquanto espécime de “príncipe perfeito” do nosso tempo.
Não é que as figuras dos dois navegadores aéreos desmereça admiração: eles demonstraram a determinação e o saber que permitiu salvarem-se de um projeto quase suicidário, porque falho de investimento bastante para o concretizar nas mais básicas condições. Mas a campanha mediática em seu torno teve muito de catarse de um país ainda iludido quanto à dimensão e importância do seu fantasmagórico império e que continuaria a ser sobre isso vigarizado pela contínua propaganda salazarista.
A monarquia lusa já demonstrara a pequenez, quando a Inglaterra a humilhou com o episódio do ultimato, que pôs fiz à ambição de concretizar o mapa cor-de-rosa. Depois, foi com o pretexto de manter as colónias africanas, que Afonso Costa mobilizou o país para as trincheiras da Flandres. E, cereja podre em cima do bolo, foi para preservar essa fraude, que Salazar mandou gerações de jovens avançar em força para Angola e, depois, para a Guiné-Bissau e Moçambique, quando a Europa estava a transformar em exploração económica neocolonial a que assentara em dominação política.
Na fundamentação de Sacadura Cabral junto do governo, que lhe esportulou uns dinheiros para o projeto, era óbvia a intenção de dar crédito à ideia imperial. Mas, fosse país economicamente forte e ele teria sido cumprido facilmente mediante os saberes dos dois aviadores. Não se justificaria explorar a veia “heroica” para o concretizar.
É essa a lição a tirar: baseemo-nos nas competências, ajustemo-las a objetivos tangíveis e potenciemos o retorno. Caso contrário, e se nos fundamentarmos no exclusivo voluntarismo, os resultados trágicos tornam-se prováveis. A menos que, como sucedeu com os aviadores, a sorte continue a enganar quem por ela queira ser enganado...
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