terça-feira, julho 04, 2023

Percursos criativos no seu início

 

De anónima Vivian Maier quase se transformou numa pop star, quando se revelou o conteúdo das muitas caixas de negativos, que deixara sem nunca arriscar a divulgação. Como se tão-só a interessasse o ato de fotografar e o soubesse tão efémero quanto a própria vida.

A pulsão para eternizar o instante sem se iludir com tal hipótese, terá sido epifania no início dos anos 50 quando regressou a França para receber a herança de uma tia recém-falecida na aldeia alpina de Saint-Julien-en- Champmaur. Vivian estivera aí com a mãe, pouco antes da Segunda Guerra, quando a acompanhara na fuga a um casamento infeliz contraído além-Atlântico. Com uma pequena câmara pretendia recolher a memória dos familiares aí residentes, assim captando a vida rural da época, e demonstrando-lhe a potencialidade de uma vocação artística tão repentinamente descoberta.

A breve estadia em França e a pequena herança facultaram-lhe os meios para levar mais a sério uma obra, que avançará da temática rural para a urbana em que se focalizará doravante, dando-nos memória visual da segunda metade do século transato norte-americano e das mudanças sociais e culturais nele percetíveis.

A transição do rural para o urbano também foi assumida por Joyce Carol Oates, uma das mais importantes escritoras norte-americanas do século XX, ao instalar-se em Detroit para ser a primeira mulher a tornar-se professora numa das universidades locais. 

No início dos anos 60 a Motown vivia a sua época dourada, dali saindo os carros-banheira, que engarrafavam as autoestradas americanas. Mas a crise espreitava e a década concluir-se-ia com grandes lutas sociais, que precipitariam o declínio da cidade e denunciariam as agudas desigualdades de rendimentos entre quem vivia nos seus bairros pobres e os que se iludiam com o seu falso esplendor.

Eles é o romance, que consagrou a escritora e melhor retrata essa América sórdida em que Maureen, a protagonista, constata não existir espaço para os tão prometidos sonhos de um modo de vida ideal. Porque ela é a alter ego de Joyce, por essa altura impressionada com o sucedido com um dos seus mais brilhantes alunos, que se suicidou depois de assassinar um rabino.

Quando publicou o romance, já ela se exilara para o outro lado da fronteira, buscando maior quietude na serenidade canadiana. 

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