segunda-feira, novembro 13, 2006

SÃO, DE FACTO, TEMPOS INTERESSANTES

Se é certo que a governação de Sócrates não entusiasma - ainda não consegue transmitir a iminência de tempos melhores em que se fundamente as esperanças individuais - há uma credibilidade do que propõe como via de acesso a menores dificuldades. Mas, qual Nanni Moretti, também gostaria de ouvir dos lábios do primeiro-ministro algumas ideias de esquerda com maior frequência. Vale, por agora, uma completa crise de imaginação de uma direita espoliada de muitas das suas estratégias. E quando as críticas vêm enunciadas por Miguel Frasquilho fica-se com a noção de uma completa impreparação do PSD para sugerir alternativas mais consistentes. No jornal citado algumas linhas acima, a Helena Garrido comentava alguns dias atrás:
«A ideia de avaliar a evolução da despesa com valores absolutos, como ontem vimos por parte de um responsável do PSD, com formação no domínio da economia, é lamentável. Não é possível acreditar que alguém considere viável reduzir o peso do Estado na economia com diminuições efectivas nos gastos do Estado. Se aquilo a que vamos assistindo nas ruas com o que está a ser feito é o que é, com manifestações e greves, como seria se um qualquer Governo decidisse reduzir mesmo os gastos?»
Outra demonstração de falta de credibilidade do PSD tem a ver com o comportamento do seu líder, Marques Mendes a respeito da Madeira: esquecendo-se de quando foi desprezado e até mesmo insultado por Alberto João Jardim apressou-se a ir ao arquipélago apoiar o despesismo do Governo Regional, desculpabilizando ao correligionário o que ao Governo critica. Um comportamento de troca tintas, que pressagia um funeral político num futuro próximo.
Mas se a política de José Sócrates não evita a tremenda crise de emprego, que afecta não só os trabalhadores com menores qualificações académicas, mas também licenciados e bacharéis, não existem grandes alternativas de esquerda para ela. Vivemos tempos interessantes, na acepção de Hobsbawn, em que se podem prever graves crises políticas e sociais, mas ainda se não encontraram condições para lhes dar a resposta mais eficaz.
Não é com esta comunicação totalmente controlada pelos grandes grupos financeiros, que os cidadãos eleitores irão ganhar a consciência ideológica necessária para se furtarem às armadilhas semeadas na informação disponível. Que os leva a assumir como bons certos estereótipos no mínimo polémicos, como o do completo apagamento de conceitos marxistas…
Ora, eu defendo claramente a exequibilidade de surgir um marxismo reformulado e actualizado, que abra caminhos para sociedades mais justas. Falta só pensá-lo, reenquadrá-lo nos dias de hoje e implementá-lo de uma forma mais bem sucedida que nos diversos países ex-comunistas.
Vem a propósito retomar uma velha, mas actualíssima, citação de Abraham Lincoln:
«É possível enganar toda a gente durante algum tempo, e mesmo alguma gente durante todo o tempo, mas não é possível enganar toda a gente durante todo o tempo.»
Lá virá o tempo em que esta aparente aceitação passiva perante os axiomas capitalistas - e das suas cruéis consequências - conhecerá uma inflexão determinante sobre o que será o conceito de Democracia na segunda metade do Século XXI.
A citação de Abraham Lincoln aplica-se, igualmente, ao sucedido nas eleições norte-americanas: provando como as opiniões públicas são muito voláteis a aceitação quase total das políticas de George W. Bush à época da invasão do Iraque deu lugar à sua maioritária rejeição. Dizia António José Teixeira a este propósito no editorial do «Diário de Notícias»:
«Censurar um presidente em tempo de guerra não está na tradição americana. Se aconteceu agora é porque os americanos estão fartos de guerra e não acreditam na sua justificação. O descrédito da Administração Bush é evidente.»
Para a derrota total de tão sinistra personagem só falta impor às novas autoridades iraquianas a não aplicação da pena de morte sobre Saddam Hussein, já que os factos estão a demonstrar à saciedade o erro em que lavrou todo o Ocidente ao removê-lo do poder em Bagdad. Não teria morrido tanta gente, nem tanta miséria teria acontecido, se tivesse havido quem demonstrasse a Bush, Blair, Aznar e Barroso, que os interesses das Enrons, Halliburtons ou Bechtels não justificavam uma agressão de que só aproveitariam os terroristas.
E, como escreveu Jorge Coelho:
«Faz todo o sentido que países e movimentos ocidentais se mobilizem para que a sentença não seja executada. Os valores da nossa civilização não se coadunam com a pena de morte. Apesar de alguns silêncios, esta tese começa a ganhar força e temos de a fazer valer junto das autoridades iraquianas. Não é para isto que soldados europeus andam a morrer em solo iraquiano»

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