segunda-feira, maio 01, 2006

«LISBOETAS» de SÉRGIO TRÉFAUT

Eles estão aí no meio de nós. São brancos (muito claros, porque eslavos), são negros, são amarelos. De todas as cores e de todas as latitudes. Mas lisboetas de facto, porque aqui procuram esse paraíso na Terra, que lhes escapou no lugar onde nasceram.
E temos a concretização de tudo quanto de pior encontramos na emigração e nos escusamos de olhar.
A exploração, por exemplo. Há um negro, que trabalhou doze horas de seguida para só receber 25 euros. Ou o engajador, que nem quer continuar a conversa, quando lhe acenam com a exigência de contrato de trabalho.
As condições de miséria. A pernoita em quartos minúsculos e caros, quando não mesmo em frágeis abrigos na rua. A tentação do alcoolismo, quando não se tem qualquer família e apenas se encontra socorro para a doença na carrinha, apenas dotada do suficiente para os cuidados mais básicos.
A dificuldade de comunicação. Que se procura debelar no difícil manejar do português em aulas aonde se aprende a dizer «aldrabão» ou «coçar-se. Ou quando nos Serviços de Emigração são inexistentes os tradutores, que pudessem facilitar a compreensão quanto aos (muitos) papéis a preencher como forma de se legalizarem. Ainda assim existem jornais apostados em servirem de veículo facilitador dos passos perdidos desses homens e mulheres nos caminhos da cidade.
A religião. Que é uma forma de identidade, seja ela ortodoxa, muçulmana, protestante ou qualquer outra. Aonde as pessoas se encontram e trocam experiências, sentindo-se menos sós neste sítio, que se julgou recheado de gente rica e, afinal, tão diferente do que, lá longe, se imaginara.
Mas há também o contraponto: os telefonemas para casa como forma de mitigar saudades, os bailes animados ou as idas à praia para encontrar o fascínio do oceano. No limite há quem se arrisque a ter filhos, apostando num futuro bem mais próspero do que este presente de empregos inseguros e mal pagos.
O filme do Sérgio está à medida do que dele conhecemos: sensível e fraterno para com esses desvalidos de todos os continentes a quem a pobreza empurrou para a aventura tremenda de buscar a sobrevivência entre nós.
Que os olhamos desconfiados, como se não fizessem parte integrante da sociedade, que é a nossa...

Sem comentários: