terça-feira, outubro 11, 2022

A Távola de Rocha, Samuel Barbosa, 2018

 

Uma frase de Paulo Rocha antes de começarem a desfilar as imagens do documentário de Samuel Barbosa: “o filme é uma espécie de mesa onde toda a gente traz aquilo de que for capaz e onde depois fica o melhor. Fico extremamente feliz quando alguém pensa que esse esforço vale a pena”.  E, não muito depois, as palavras ditas por quem muito bem o conheceu e o descreve pelo entusiasmo manifestado por uma qualquer janela capaz de lhe justificar o exercício de imaginação sobre o que poderia esconder-se por trás dela.

Paulo Rocha foi mais do que o pai do cinema novo português, que soube lançar com Os Verdes Anos em 1963 e  Mudar de Vida em 1966. Sempre apostado em fazer filmes diferentes uns dos outros neles vincou o entusiasmo pela civilização nipónica numa abordagem ao universo singular de Wenceslau de Moraes, ou ao fenómeno sebastianista, quando a Revolução de Abril já se esvaíra. Ou ainda ao fascínio pela aventura do próprio pai, esse jovem, que partira para o Brasil ainda adolescente e de lá regressara enquanto razoavelmente bem sucedido emigrante de torna-viagem.

Barbosa, que trabalhou com Paulo Rocha durante vários anos, ouviu quem com ele trabalhou - Isabel Ruth, Luis Miguel Cintra, Regina Guimarães - para dar-lhe um retrato complexo, porque multifacetada era a sua personalidade. E vai balizando esses testemunhos em muitos extratos dos filmes, que se fundamentavam numa ambição conceptual, que o afastava do mainstream, e o condenava a um estatuto de personalidade extravagante como o foi também Manoel de Oliveira (que o considerava o melhor realizador da sua geração) ou o é Pedro Costa. Revisitam-se esses momentos e confirma-se a conclusão de se entrar nos seus filmes com a única certeza de sugestionarem reações inesperadas. Porque, mais do que darem respostas às questões que se lhe colocavam, eram veículo dessas mesmas perguntas para as quais éramos nós próprios convocados a encontrar soluções. 

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