terça-feira, maio 03, 2016

FESTIVAL INDIE: «Flotel Europa» de Vladmir Tomic

No trailer do filme vemos uma mulher bósnia a falar para a câmara, porque foi essa a melhor alternativa para dar a ver à família as condições em que ela e os dois filhos se encontravam enquanto refugiados da guerra ainda em curso nos Balcãs.
Essa carta em forma de filme seria uma das que Vladimir Tomic utilizaria para evocar esse tempo de estagnação num espaço exíguo na periferia da cidade de Copenhaga. O governo dinamarquês enfiara então centenas de pessoas num antigo navio, atracado num dos muitos canais em torno da cidade.
É evidente que, olhando para as condições então propiciadas aos que fugiam ao conflito e as agora garantidas aos que provém da Síria ou do Iraque, a discrepância é abissal. Mas, mais do que um filme sobre a receção europeia a quem se vê obrigado a procurar alhures a segurança, que lhe falta na sua terra, «Flotel Europa» é, sobretudo, um documentário sobre a lenta degradação do ambiente entre os próprios exilados. A pouco e pouco as rivalidades, que tinham criado as hostilidades na Bósnia, são as mesmas que levam católicos, muçulmanos ou ortodoxos a olharem-se ali com desconfiança, se não mesmo com agressividade.
Vladimir tinha então doze anos e é um dos filhos dessa mulher, que testemunha os seus dias à família por imagens. Quase um quarto de século entretanto decorrido, o projeto de pegar em todas as imagens então recolhidas no Flotel Europa e dar-lhes uma progressão dramática, suscitada pela longa espera sem perspetiva para o seu fim, acaba por transformar aquele espaço num universo concentracionário onde passam a compreender-se todas as manifestações de frustração: alcoolismo, droga, suicídio, violência doméstica, etc.
Quando Vladmir, a mãe e o irmão saem do navio e são realojados num pequeno apartamento, onde possam usufruir finalmente de alguma privacidade, a guerra ainda está longe do fim. Mas o filme acaba nessa altura, porque o seu objeto, o de uma estrutura flutuante transformada em campo de refugiados, foi solução abandonada pelo próprio governo dinamarquês, ciente das disfuncionalidades suscitadas por um ambiente (socialmente) tão insalubre...

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