quarta-feira, outubro 28, 2020

(DIM) O trágico destino dos Romanov, Patrick Cabouat, 2017

 


Tal como não verteria uma lágrima pelas mortes de D. Carlos I ou do príncipe Luís Filipe - ao contrário do que aconteceria com as de Manuel Buíça e Alfredo Costa - também nenhum estado de alma dedicaria ao fuzilamento dos Romanov. Republicano dos sete costados prefiro que a queda das monarquias ocorra sem sangue mas para grandes males, grandes remédios, sobretudo se, como sucedia com o regime czarista, estávamos perante uma ditadura obsoleta, que só Nicolau II e Alexandra  pareciam não compreender quanto ultrapassada estava em relação aos valores do seu tempo. Mesmo tendo o precedente do assassinato do avô, Alexandre II, em 1881, a anunciá-lo,

Acresce que, sobre a História da Revolução Bolchevique interessam-me bem mais os dez dias que mudaram o mundo e os que se sucederam nos anos seguintes, até Estaline afirmar o seu ascendente sobre os seus colegas de partido. Secundário é como vejo o episódio sangrento de Ekaterinburgo em julho de 1918, particularmente explorado pela propaganda anticomunista ocidental, que procurou santificar o martírio dos Romanov em contraponto ao carácter «diabólico» dos seus assassinos.

Que Putin tenha devolvido à Igreja Ortodoza a importância, que tinha nessa época, e até promovido uma homenagem póstuma aos Romanov demonstra bem que o atual líder russo dissociou-se de toda a ideologia aprendida nos anos do KGB e orienta-se por uma orientação fascizante, que explica a sintonia com as extremas-direitas europeias.

Qual o sentido, pois, deste documentário de quase hora e meia, realizado por Patrick Cabouat há três anos? A curiosidade reside no facto de se basear no testemunho escrito e fotográfico do precetor suíço Pierre Gilliard, que se incumbiu da educação do herdeiro do trono, o príncipe Alexis, desde 1904.  Embora olhasse para a política russa com o distanciamento de quem a sabia passadista, Gilliard consegue tornar-se tão intimo da família, que o hospeda, que os seus documentos são fundamentais para compreender a incontornabilidade da Revolução. E acompanhando-a ainda no período em que estava detida na residência onde os patrões seriam mortos, Gilliard escapa incólume à fuzilaria devido à sua nacionalidade estrangeira. 

(S) O Mandarim Maravilhoso de Bela Bartok

terça-feira, outubro 27, 2020

(DL) Blue Bay Palace, Nathacha Appanah, 2004

 


Foi descoberta dos últimos dias: apesar de se tratar de um romance publicado há dezasseis anos e a autora já ter entretanto mais oito títulos no cartório. Nathacha Appanah era-me totalmente desconhecida, provavelmente por pouco tempo, porque começa a ser presença assíduanas listas dos potenciais candidatos aos mais importantes prémios literários franceses, o Goncourt ou o Femina, tornando-se provável a regra de ir tantas vezes o cântaro à fonte, que um dia acontece o expectável.

A história de Blue Bay Palace passa-se na Ilha Maurícia junto das comunidades herdeiras daquelas levas de indianos para ali trazidos, quando a escravatura foi ilegalizada e os senhores dos engenhos de cana-de-açúcar encontraram dificuldades de mão-de-obra para manterem produtivas as explorações. Século e meio depois essa sociedade indiana está bem estratificada, com os comerciantes, os latifundiários e os donos dos hotéis a assumirem-se como brâmanes ou equiparados, enquanto os pescadores ou os criados são olhados como dalits.

Maya tem dezasseis anos e vive na ponta da ilha onde habitam os que buscam sustento no mar ou estão empregados no luxuoso hotel ali implantado. Numa feira conhece Dave e é o amor à primeira vista. Porque ele é gerente do empreendimento turístico, onde o pai trabalha, Maya depressa manda às malvas o projeto de sair do espaço exíguo da ilha para buscar futuro mais ambicioso na Europa, e não descansa enquanto não consegue emprego de rececionista de forma a estar o mais perto possível do amante.

Durante dois anos vive a ilusão de se vir a casar com ele, mas a desilusão torna-se imensa, quando um jornal local anuncia o mediático casamento, que unirá duas das mais importantes famílias de Mahébourg.  Se a cobardia dele a agasta e a leva a agredi-lo violentamente, maior ainda é o descontrolado ódio à rival, que ver-se-á vítima da sua determinada vingança. De permeio, ainda que o amor desapareça, subsiste o desejo que ela satisfaz na clandestina relação com Dave até dele se fartar ou com o jardineiro da sua mansão, que lhe serve de oportuna forma para a ela aceder. 

Seguindo o plano até ao desiderato esperado, Maya demonstra um carácter forte, mesmo que eivado de uma ingenuidade, que nos vai inquietando, porque ora feita de empatia, ora de fundamentada censura.

(S) A Rapsódia nº 1 para violino e piano de Bela Bartok

domingo, outubro 25, 2020

(DIM) A Rainha, Stephen Frears, 2006

 


Se certezas tenho quanto ao futuro é a de que me manterei tenaz republicano até ao derradeiro suspiro. A antipatia pela instituição monárquica não se deve tão só ao facto de o atual pretendente ao trono ser um manifesto atrasado mental ou porque, num delicioso ensaio sobre as misérias e grandezas dos príncipes de Portugal, o mestre Aquilino cedo me esclareceu sobre a falta de qualidade dos nossos reis de que não se consegue reter qualquer episódio de grandeza.

Se os portugueses ganharam nome como navegadores não foi por qualquer grandeza, nem tão pouco pela suposta intenção de irem espalhar a fé junto dos gentios, mas tão-só para ganharem o sustento, que o cantinho aqui à beira-mar plantado era demasiado pobre para lhes sustentarem as intenções gananciosas. Depois, como corolário dessa «gesta», a nação lusa ficou manchada tenebrosamente pela má fama dos seus negreiros.

Adiante. Vem isto a propósito do canal ARTE repetir a apresentação do filme, que Stephen Frears dedicou ao momentâneo abanão ocorrido no Palácio de Westminster, quando Diana morreu com o amante num acidente em Paris e Tony Blair tudo fez para manter incólume a monarquia naquele que foi mais uma ação nefasta a acrescentar à sua mais do que lamentável passagem pelo poder. É certo que ainda andava a conhecer a residência de Downing Street para que acabara de se mudar na sequência da bem fresca vitória eleitoral, pelo que lhe interessava tudo menos fazer ondas, mas o Tonecas inglês, embora com pretensões sofisticadas, nunca mostrou capacidade para ir além de mera marioneta das ideias reacionárias de Anthony Giddens. Ademais a Rainha e a sua corte estava de férias em Balmoral, na Escócia, nessa noite de 30 para 31 de agosto, quando Diana Spencer e Dodi Al-Fayed ganharam direito a verem a sua relação amorosa espelhada nas capas dos jornais de todo o planeta, pelo que ele viu-se abandonado em Londres sem ter com quem partilhar de imediato o bébé que lhe caía no regaço.

Frears explora a vertente da súbita empatia manifestada pela população àquela que ficaria conhecida na altura como «princesa do povo» como se a expressão não constituísse absurda mistificação atendendo aos diferentes interesses entre ela e a maioria dos britânicos. Na altura a execração da Rainha alcançou tal clímax, que o advento da inevitável República, que Cromwell chegou a declarar e depois foi enterrada pelos interesses dos senhores feudais, poderia ter surgido de uma espécie de fagulha capaz de incendiar toda a pradaria para utilizarmos a feliz expressão do camarada Mao, mas Blair cuidou em que tal não sucedesse. Prova de como a História vê perdidas oportunidades, que demora depois a reencontrar.

O filme mostra como os Windsors são ridículos - vide a cena em que Filipe decide levar os netos à caça para os distrair da notícia da morte da mãe ou a ferocidade da já nonagenária rainha-mãe - mas o próprio Blair surge como meio-estarola (papel bem ajustado para o competentíssimo Michael Sheen neste tipo de personagens!). Se um tenaz republicano vê e revê o filme é só por ser Helen Mirren a desempenhar o papel principal. E a Dame Mirren, apesar dela própria dar entrevistas em que expressa ideias tolas, não deixa de ser atriz de grande gabarito. E por isso mereceu o Óscar de 2007 como melhor atriz principal.

(DIM) O Festim dos Animais, Daniela Pulverer e Boris Raim, 2020

 


Na Natureza nada se perde, tudo se transforma. A conhecida máxima de Antoine Lavoisier surge explicitamente comprovada neste documentário recente de produção alemã sobre o labor dos cientistas no estudo do que se passa com as carcaças de animais, quando morrem nas florestas da Baviera.

A morte de uns garante a sobrevivência de muitos outros através de uma ininterrupta sucessão de interações, que começam nas larvas, nos organismos que se alteram quimicamente ou nas plantas alimentadas através dos nutrientes desses cadáveres. Desde o mais ínfimo rato ao imponente veado, os corpos em decomposição servem de refúgio para formas de vida minúsculas e convertem-se em oportuna alimentação para necrófagos até nada restar do despojo inicial.

O que mais impressiona são as imagens inéditas desses necrófagos em plena ação num espetáculo raramente conhecido.

sábado, outubro 24, 2020

(DIM) O Regresso dos Ursos, Simone Stripp e Jurgen Hansen, 2019

 


Este ano a pandemia frustrou-nos os planos de regresso a geografias de grata memória, e onde pretenderíamos reviver o quanto ali vivenciáramos. Nalguns deles talvez pudéssemos dar com um urso escondido atrás de alguma árvore tão frequentes eles voltam a tornar-se nalgumas dessas paisagens. De facto, segundo o documentário O Regresso dos Ursos, eles podem ser vistos dos Pirenéus à Europa de Leste, passando pelo Norte da Itália. Na Eslovénia, o país dos outros avós das nossas netas, eles são muitos e têm demonstrado a exequibilidade de uma convivência pacífica com os humanos. Apesar de se tratar de um dos maiores produtores europeus de mel e sabermos quanto os plantígrados se deliciam com tal ágape.

Estão criadas as condições para remeter definitivamente para o passado a tendência para serem caçados e exterminados sem qualquer contenção. Nos anos mais recentes a União Europeia tem-se mostrado ativa na reintegração dos ursos em áreas onde eles, em tempos, constituíam populações significativas, tendo em conta o seu importante papel na sua reflorestação, devolvendo-lhes as características perdidas com a utilização ineficiente dos solos entretanto empobrecidos.

Os pastores e criadores de rebanhos mostraram-se reticentes, mas vão-se rendendo à evidência de serem raros os ataques a pessoas por parte desses novos habitantes. Ademais imbuem-se dos conhecimentos seculares das populações romenas ou eslovacas, que se habituaram a conviver com a espécie sem percalços de maior.

Os cientistas, que acompanham a reintrodução dos animais em habitats há muito deles desconhecidos, procuram identificar as práticas a implementar para que o projeto tenha o merecido sucesso...

sexta-feira, outubro 23, 2020

(DIM) Drunk, Thomas Vinterberg, 2020

 


Thomas Vintenberg tornou-se-nos conhecido com um filme de 1998, A Festa, enquadrado nos preceitos do movimento Dogma, que ajudara a criar com Lars von Trier e fazia do cinema dinamarquês um dos mais originais no final do milénio transato. Desde então tem tido percurso irregular, alternando filmes mainstream  - Longe da Multidão (2015) ou Kursk - A Última Missão (2018) - com outros mais tipicamente de autor. Destes últimos como esquecer A Caça (2012) em que um professor de uma creche desmentia a tese absurda de alguns pedopsiquiatras para os quais as crianças nunca mentem? No caso em apreço uma miúda de cinco anos afirmava-se abusada pelo professor e virava-lhe a vida do avesso, quando, até então, estava bem integrado na comunidade em causa.

Drunk, que veremos provavelmente estreado entre nós se os distribuidores nos continuarem a possibilitar a descoberta do universo criativo do realizador, insere-se na vertente mais autoral de Vintenberg e volta a ter Mads Mikkelsen - seu verdadeiro alter ego - como protagonista. O tema é o da influência negativa do grupo sobre o indivíduo de acordo com a parte do provérbio em que se diz: junta-te aos maus e serás pior!

Olhemos para a história: Martin, professor de história num liceu, anda desalentado, ciente de ter perdido estatuto social e autoridade junto dos alunos. A vida conjugal, por seu lado, também está complicada, contribuindo para a tentação depressiva. Sentimento partilhado por três colegas - Nikolaj, Tommy e Peter - todos eles convencidos de os seus melhores anos terem ficado impreterivelmente para trás.

Ocorre-lhes, então, experimentarem a proposta de um psiquiatra norueguês, que explicaria esse lado sombrio das pessoas pela falta de 0,5 gr de álcool por litro de sangue. Se se conseguisse manter esse patamar de semialcoolismo tudo seria diferente.

A experiência pseudocientífica começa por se revelar animadora para os quatro professores: Martin sente que os alunos voltam a prestar-lhe atenção, a mulher reencontrou o sorriso. A turma de Peter canta afinadamente e a de Tommy volta a marcar golos.

Dados os bons resultados Martin propõe que levem a experiência para outro patamar: o de 1 gr de álcool por litro de sangue. Mas, quase de imediato, a situação degenera: as relações entre Nikolaj e a mulher deterioram-se, Tommy não encontra freio no esvaziamento das garrafas e Martin leva com uma porta na cabeça.

Face ao descalabro os quatro amigos encontram-se para uma derradeira bebedeira, mas o desenlace é calamitoso: Nikolaj urina na cama, Martin aparece em casa quase em coma etílico e a mulher impõe-lhe a separação. É então que o grupo decide pôr fim á experiência, mas para Tommy é demasiado tarde, suicidando-se depois de expulso de um estabelecimento.

No funeral do amigo os três sobreviventes são levados pelos alunos, que estão a festejar o fim do ano escolar. Peter, que se julgava desprezado por eles, é carregado em ombros e Martin recebe a mensagem da mulher a propor-lhe novo recomeço. Descobrindo em si a capacidade de recuperar a perdida alegria, dança freneticamente

Drunk constata que a vida está longe de ser um rio tranquilo, multiplicando-se as razões para que se acumulem deceções, disputas, derrotas, desaparecimentos. Daí a mitificação de um passado em que nada disso teria ainda ocorrido. Fugir à realidade, encontrar refúgio no álcool ou noutra qualquer forma de o conseguir, torna-se demasiado tentador. Sobretudo se, como ocorre com os quatro protagonistas, arranja-se uma desculpa tão credível quanto o parece ser um estudo com pretensões (falsamente) científicas. Tornando-se até convincente o alibi de, entre Churchill e Hitler, ser o primeiro quem assumia o prazer propiciado pela bebida. E não propunha Kierkegaard  que todos nos aceitássemos como sujeitos falíveis?.

Embora para Tommy a lição se revele tardia, Martin, Nikolaj e Peter concluem que a solução está na capacidade de se revelarem solidários entre si, em não se sentirem sozinhos. A vida ganha sentido quando nos integramos junto de quem connosco tem afinidades e tornando-nos melhores de entre os bons. Aceitar a vida como ela é, eis a lição que Vintenberg propõe neste seu mais recente filme... 

quarta-feira, outubro 21, 2020

(DL) Mulheres de exceção e viagens iniciáticas

Pouco antes de partir para a Segunda Guerra Romain Gary despediu-se da mãe em Nice onde ambos tinham-se radicado depois de fugirem aos constrangimentos sentidos pelos judeus na Lituânia natal, então pertencente à Polónia. Seria a última vez que a veria viva, porque, tão-só consumada a derrota na drôle de guerre, partiu para Londres ao encontro de De Gaulle, sob as ordens de quem se colocou para ajudar no volte-face à momentânea vitória nazi. Quando, depois de muitos combates, celebrou a vitória já Nina morrera, vítima dos diabetes e das carências médicas e alimentares de então.

A Promessa constitui uma autobiografia de homenagem a essa mulher, misturando tempos entre a infância marcada pela ausência do pai - vítima do Holocausto, mas que nunca chegara a conhecer -, a adolescência em que ela instigara-o a tornar-se exímio violinista e a emigração para o sul da França. A conclusão é sintetizada nesta frase definitiva: “Com o amor maternal a vida começa por prometer aquilo que nunca cumprirá”

Se Gary prestava tributo à mãe, quando já vivia em Big Sur e estava quase a conhecer outra mulher determinante na sua vida - a atriz Jean Seberg tão tragicamente desaparecida em 1979, provavelmente assassinada pelo FBI a mando de Edgar Hoover! - Henry de Montherlant focalizou-se na personagem de Inês de Castro na altura em que o autor de A Promessa andava pelo norte de África a combater os exércitos de Rommel.

O escritor, que conquistara mitigada notoriedade antes da Ocupação, teria em La Reine Morte o sucesso, que o consagraria como um dos mais prestigiados escritores francesesdo século transato, ainda que associado aos tidos, ideologicamente como mais conservadores a exemplo de Mauriac, Bernanos ou André Gide.

A ideia para a peça surgiu-lhe quando viu a história levada à cena num teatro parisiense numa adaptação da obra de um autor espanhol do Século de Ouro: Luis Velez de Guevara. Se Pedro e Inês conservam os nomes originais, Afonso IV é crismado de Ferrante, nome fonéticamente mais apropriado para quem se mostra inflexível nos valores e decide mandar matar aquela que o filho desposara em segredo, prejudicando os seus acordos com o reino vizinho.

Pessoalmente nada me diz a busca de um suposto Absoluto, que Montherlant pretendia encontrar através do que escrevia. Se alguma vez o encontrou, com ele o levou para a cova, porque lhe cumpriram os desejos de eliminar os diários, que escreveu durante quase toda a sua existência. Mas, formalmente, estranha-se o facto de quase nada acontecer nos dois primeiros atos, sobretudo se pensarmos que o texto literário foi concebido para ser levado aos palcos. Mas o próprio escritor reconhecia que La Reine Morte era mais para ser lido do que representado.

Outra é a natureza de La Prose Du Transsiberien Et De La Petite Jehanne De France, que Blaise Cendrars criou entre finais de 1912 e inícios de 1913, quando o cubismo entusiasmava os artistas vanguardistas de Montmartre e o casal Delaunay começava a tornar-se incontornável na definição de novos rumos para as ruturas estéticas com os pós-impressionistas.

Sonia ilustrou a viagem interior propiciada pelos dias no Transiberiano empreendida por um jovem adolescente acompanhado por uma prostituta com nome de heroína gaulesa. Através de 446 versos livres, capazes de transpor por palavras as experiências vividas pelo autor que, entre as aventuras reais e as imaginadas, sempre deixou uma margem para aferirmos quais terão sido umas e outras.

Henry Miller considerou a obra como um “arquipélago da insónia” pelo qual Cendrars faz coincidir a sua mitologia sobre a viagem iniciática, aqui vivida pelo aventureiro Rogovine, com a mitologia coletiva associada às revoluções em curso por toda a Europa, com o comboio a surgir como espaço de observação para o que elas pressupunham. Vinte anos antes do surrealismo, ela anunciava-o com uma violenta beleza.