segunda-feira, abril 23, 2018

(DIM) Dois filmes sobre a condição de ser negro na América


Não foi por acaso que «Moonlight« e «Elementos Secretos» foram oscarizáveis em 2017, muito embora os prémios só tenham bafejado merecidamente o primeiro. É que o escândalo da cerimónia anterior, em que nenhuma nomeação sorriu a um ator ou técnico negro, causara mossa e pusera os estúdios a corrigir a falha. Mal imaginavam que, no final do ano, o eleitorado levaria para a Casa Branca o presidente mais racista das décadas recentes.
O filme de Barry Jenkins mereceu a consagração, impondo-se nomeadamente ao foguetório do «La La Land», porque é o que mais escapa aos estereótipos hiperabusados em filmes com negros. Os problemas dessa comunidade estão todos lá referidos - a droga, a violência, as famílias sem a presença do pai, etc.— mas somam-se-lhe outros, tão pertinentes como esses (o bulling, a homofobia, a falta de oportunidades sociais, etc), que ganham importância maior no desenvolvimento da narrativa. E existe o que mais vale enfatizar: a solidariedade entre os humilhados e ofendidos do passado com os de hoje, que mitigam as dores de um quotidiano onde viver se revela desafio assaz difícil de vencer.
Outra coisa é o filme sobre as matemáticas da NASA escondidas dos holofotes principais dos sucessos da agência espacial apenas pelo facto de serem mulheres e, sobretudo, negras. Apesar de nos afiançarem tratar-se de uma história baseada em casos reais, lá aparecendo no genérico o paralelo entre as atrizes e as verdadeiras personagens que representaram, tudo aquilo é embrulhado num invólucro adocicado em que os brancos racistas acabarão por dobrar-se ao talento e às capacidades das três heroínas e tudo acaba segundo a expressão francesa tout le monde est beau, tout le monde est gentil.
Ao longo da apreciação deste entretenimento, comparei-o amiúde com um dos filmes da minha vida, «The Right Stuff», em que Philip Kaufman também cuidava de ilustrar os primeiros tempos da NASA. A incipiência do filme de Theodore Melfi torna-se tão notória, que a vontade é procurar o de há vinte cinco anos na DVDteca caseira e torná-lo antídoto eficaz contra uma visão que dos negros lembra a da tia Jonet a respeito dos pobrezinhos. 

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