segunda-feira, abril 02, 2018

(DIM) «A Infância de um Líder» de Brady Corbet


O que mais surpreende em «A Infância de um Líder», filme de Brady Corbet, que recebeu alguns dos mais prestigiados prémios do Festival de Veneza de 2015, é a sua estranheza. À partida temos um conto de Sartre a demonstrar como a educação de um miúdo influi na sua ascensão a ditador muitos anos mais tarde. Por isso mesmo está dividido em quatro partes, sendo as três primeiras constituídas por outras tantas birras, e a última como mera explicitação do monstro em que se transformou décadas depois. Como fundo histórico temos os bastidores do Tratado de Versalhes em 1919, quando o pai de Prescott é um dos diplomatas norte-americanos incumbidos das negociações para encerrar o conflito. Mas não é a política, que interessa, porque importa bem mais o relacionamento difícil do rapaz com a progenitora, uma mulher incapaz de transmitir afetos, demasiado fechada no puritanismo religioso e na escusa a qualquer contacto sexual com o marido. Não admira, pois, que seja numa das criadas, Mona, que o rapaz encontre a almejada figura maternal, embora não enjeite procura-la igualmente na precetora Ada, muito embora esta seja provavelmente a amante do progenitor.
O ritmo é lento, lembrando Bresson, e a banda sonora de Scott Walker bastante impressiva, constituindo-se amiúde como um dos personagens determinantes da ambiência do filme, que vale, igualmente, pelo cuidado posto nos cenários e nas interpretações dos atores, particularmente do incrível Tom Sweet, que tanta verosimilhança instila no papel do jovem protagonista.
Totalmente diverso do que vamos vendo no cinema, «A Infância de um Líder» incomoda na inconsequência em que nos mergulha. Porque a questão de fundo é esta: ok, a indiferença da mãe, a latente agressividade do pai (mas sê-lo-á de facto, dadas as semelhanças ulteriores com Charles, o amigo da família, ambos os papéis desempenhados por Robert Pattinson?) e a dissociação de um ambiente com que facilmente se pudesse identificar são as razões bastantes para gerar um ditador?
Não deixa de ser, igualmente, paradoxal, que o filme tenha sido rodado na Hungria, país como se sabe «governado» por um émulo do adulto em que Prescott se tornará.

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