domingo, abril 01, 2018

(AV) Delacroix no Magrebe


Entre 29 de março e 23 de julho o Museu do Louvre apresenta uma das grandes exposições do ano parisiense com a retrospetiva das obras de Delacroix. Neste domingo estreou-se, igualmente, o filme «Eugène Delacroix, d’Orient et d’Occident», realizado por Arnaud Xainte e tendo por tema a experiência do artista no ambiente exótico do norte de África.
Em fevereiro de 1864, os parisienses acorreram em massa ao leilão do atelier de Delacroix, que, em vésperas da sua morte, exprimira a vontade de serem colocadas à venda as obras aí acumuladas. Entre elas estavam os sete fabulosos cadernos preenchidos com notas, desenhos, esboços, e aguarelas criados durante a viagem a Marrocos, reportando rituais e cenas domésticas.
Em 1832, nos primórdios da colonização francesa na Argélia, o rei Luís Filipe encarregou o conde Charles-Edgar de Mornay de uma missão diplomática junto do sultão de Marrocos, Moulay Abderrahmane, para conseguir a retirada das suas tropas, que estavam a pelejar ao lado dos resistentes argelinos. Essa iniciativa teve grande sucesso para quem a organizou, mesmo se, ao escalar Argel, Delacroix se tenha chocado com os efeitos da brutalidade do exército francês.
O artista tinha 34 anos e liderava os defensores do romantismo, que era tão idolatrado, quanto execrado. Aquando da iminente partida do conde Mornay, candidatara-se a acompanhá-lo, sendo aceite. Conseguira assim percorrer as pequenas ruelas da casbá à luz das estrelas, descobrindo as portas ogivais, as laranjeiras em flor, os albornozes dos árabes e a sensualidade das mulheres judias e muçulmanas.
Fascinado, o artista tudo registara nos cadernos de viagens tornando-se precursor do orientalismo que tanto marcaria as décadas seguintes. Rendido ao entusiasmo por tudo quanto vira, Delacroix constatara que “o pitoresco alcança o sublime”. Estando a fotografia a dar, então, os seus primeiros passos, esses cadernos constituem o melhor exemplo de um tipo de reportagem, até então desconhecido, mas que se tornaria canónico nas décadas seguintes.
Durante toda a estadia encantara-o a simplicidade e a nobreza dos costumes, a exuberância das cores, a beleza da arquitetura, o espetáculo harmonioso da vida quotidiana e dos puros-sangues árabes. Escreveu no diário: “Sinto-me neste momento como um homem que sonha e vê coisas que teme ver evaporarem-se.” Nos mouros, que desenhara incessantemente, julgou reencontrar a beleza antiga.
Os cerca de mil desenhos que trazia no regresso a Paris dar-lhe-iam matéria para oito dezenas de quadros, entre os quais «Casamento judaico» (1841) e o excecional «Mulheres de Argel» (1834)
O filme de Arnaut Xainte associa reconstituições com atores à apresentação das obras referenciadas e contextualizadas, contando com a colaboração de biógrafos e historiadores de arte que reconhecem a natureza etnológica de um pintor de grande criatividade.

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