Agora que se acabaram os concertos dos Dias da Música no CCB, voltamos ao Festival Indie, que nos está a dar a possibilidade de ver filmes com características identitárias, que os diferenciam dos cânones de Hollywood.
A longa-metragem «In the Last Days of the City», que Tamer El Said acabou ainda há pouco de rodar, levanta logo à partida uma questão: já demonstrados os efeitos perversos das Primaveras Árabes que, excetuando a Tunísia, resultaram no caos jiadista ou em ditaduras tão ou mais férreas do que as anteriormente existentes, é natural que o realizador manifeste um indisfarçável desencanto com o quanto elas significaram. Mas seria este o filme que teria realizado se esses movimentos contestatários tivessem resultado em regimes democráticos como o que se tenta consolidar no antigo país de Ben Ali?
Os últimos dias a que se refere o título do filme acontecem em 2009, quando Moubarak está a cerca de ano e meio de ser derrubado. A praça Tahrir já estava em permanente animação com manifestantes decididos a contestar a degenerescência de um regime incapaz de cumprir os sonhos de desenvolvimento outrora personificados por Nasser, mas Khalid pouco liga ao que se passa à sua volta: recentemente abandonado pela namorada, que pensa exilar-se, precisa de arranjar um apartamento o mais rapidamente possível, muito embora já tivéssemos constatado no filme de Sérgio Tréfaut sobre os cemitérios do Cairo, como essa tarefa é quase impossível para quem vive com dinheiro contado. Há também a doença incurável da mãe, que está hospitalizada e a quem deve diariamente visitar. E o seu filme, em fase de montagem, não chega à versão final, porque, segundo o técnico que o apoia, ele vive totalmente virado para o passado, em vez de olhar para o futuro.
Amigo de três outros colegas de profissão, um libanês e os outros dois iraquianos, passa alguns dias exaltantes com eles a discutir o tipo de cinema mais adequado para as presentes circunstâncias. Mas, à exceção do que está refugiado na Alemanha e já não pensa regressar tão cedo à sua Bagdad natal, os outros dois assumem um conformismo quase fatalista em relação à incapacidade em contribuírem para uma qualquer redenção revolucionária. Um deles, o iraquiano, que rejeitava veementemente o conselho do compatriota para se lhe juntar em Berlim, acaba mesmo por morrer como vítima de um dos atentados diários à bomba, que sacodem a capital.
Já com Laila também de partida, Khalid está condenado a uma incontornável solidão...
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