Neste seu livro de contos, o escritor chileno regressa à juventude e resgata histórias do período em que militou na Federação Juvenil Socialista, razão porque viria a ser depois um dos guarda-costas de Salvador Allende.
Muito divertidos, quando retratam a inocência dos que possuíam mais determinação do que conhecimentos e competências para as ações revolucionárias, todos os nove contos exaltam, igualmente, a cumplicidade e generosidade dos que partilharam sonhos e ilusões. Sem que, tantos anos passados, eles pareçam ter perdido sentido!
Logo a começar há um conto capaz de nos levar às lágrimas de tanto rir: «O soldado Tchapaiev em Santiago do Chile» conta como, revoltados pela bênção de um cardeal norte-americano à guerra no Vietname, os militantes da Juventude Comunista do Chile e da Federação Juvenil Socialista decidem-se por um atentado à porta do Instituto Norteamericano de Cultura. Se a vontade é muita, a ciência é tão escassa, que só no local do atentado descobrem a impossibilidade de o concretizarem com sucesso. Mas o pior é o petardo quase lhes explodir na cara, destruindo-lhes não só a motocicleta em que se haviam deslocado, mas sobretudo estragando definitivamente os planos do narrador em ir ao cinema com a bela Genoveva.
O protagonista do conto, que dá título ao livro, é Ramiro, um peruano destacado para a URSS para ter aí formação universitária, mas que se vê desterrado nas lonjuras uzbeques sem conhecer quem quer que seja ou muito menos encontrar quem o possa entender. A única forma de regressar a Moscovo é disfarçar-se de camponês e fingir-se de mudo durante toda a viagem.
Nos três contos seguintes temos pequenos grupos de jovens a fazerem assaltos para financiarem projetos sociais ou vingarem-se da sabotagem dos banqueiros, que desviavam para o estrangeiro fluxos ininterruptos de dinheiro. Havendo o obcecado pela canção «Blue Velvet» ou a bela Bichito, que não possuía grande solidez ideológica, mas cuja beleza bastava para distrair as multidões do assalto ali a ocorrer mesmo ao lado.
Há igualmente a singular convivência do narrador e dos seus amigos com a embaixada da Coreia do Norte, quando esta se instalou em Santiago. Na melhor das intenções decidem inteirar-se da filosofia juche de Kim il-Sung, mas até o mais convicto dos jovens revolucionários acaba por cansar-se com tão exagerado culto da personalidade.
O desertor é um dos soldados do pequeno destacamento que, por mero acaso capturou Che Guevara e que, assistindo ao assassinato a sangue frio do guerrilheiro, decide partir ao encontro dos que combatia para deles se fazer companheiro de luta.
O outro Che do livro é um condor, que nascera de um casal dessas aves, que Allende oferecera a Fidel Castro durante a visita deste ao Chile em 1971. E assassinado tão cobardemente nos céus argentinos como o herói tombado na escola primária de La Higuera. Mas o essencial da história assenta nas vicissitudes de conseguir levar os pais dessa cria entre o jardim zoológico de Santiago e o aeroporto onde deveriam ser entregues aos cuidados dos veterinários cubanos.
O último conto do livro relata a demanda de dois companheiros de luta do comandante Camilo, tombado em combate na Nicarágua e a cujo filho de oito anos ficaram incumbidos de entregar o relógio paterno. Numa pequena cidadezinha sueca descobrem que o avô do miúdo também lutara nas Brigadas Internacionais durante a Guerra Civil de Espanha.
De fácil e agradável leitura, o livro de Sepúlveda conseguiu devolver-me as emoções de pretéritos tempos em que acreditava ter a Revolução na ordem do dia.
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