Há quatro anos «Attenberg» representara uma belíssima surpresa sobre o novo cinema grego.
Se dele guardava as belíssimas imagens dos filmes de Théo Angelopoulos, o de Athina Rachel Tsangari veio demonstrar que a passagem de testemunho estava devidamente assegurada, mesmo que num tipo de cinema muito diferente do antecessor. Onde neste havia o reequacionamento do passado, Athina propunha um cinema capaz de refletir inteligentemente o presente.
Ele está bem em evidência neste novo título - «Chevalier» - que é o nome de um anel, que seis amigos disputam ao viajarem num iate luxuoso ao longo da costa grega, enquanto comparam os desempenhos uns dos outros nos mais diversos e ridículos desafios: como se sentam à mesa, quem tem melhores dentes, com que rapidez conseguem montar uma prateleira, qual o nível de educação, que tipo de roupa interior usam, quem é mais viril, etc.
Estamos, pois, num microcosmos revelador de uma sociedade em que todos competem entre si e se avaliam. Por isso fazem-se acompanhar de blocos onde vão anotando os desempenhos comprometedores dos adversários.
E, porque estamos numa sociedade dividida entre a classe dos que tudo possuem e os que só estão destinados a servi-los, estes últimos vão comentando as vicissitudes dos sucessivos desafios.
Não é difícil chegarmos à conclusão de se tratar de uma inteligente metáfora sobre o estado a que chegou o capitalismo, que, para se preservar, cria as condições para um hiperindividualismo em que vigora o cada um por si e todos contra todos. Um quotidiano onde valores como a solidariedade ou a mera expressão de simpatia são entendidas como sintomas de fraqueza penalizáveis à luz dos padrões vigentes.
O argumento é tão bem carpinteirado, que Athina Rachel não deixou de explicitar as jogadas sujas, que se planeiam na sombra, nomeadamente quanto à cartelização do voto. E, como paradoxo pessimista da evolução para que tendemos, não vemos os explorados a olharem para o entretenimento dos patrões com sentido crítico e distanciamento, mas com admiração e até mimetização no final do filme.
«Chevalier» não é, pois, o tipo de filme para espectadores preguiçosos, necessitados de quem lhes faça o “desenho” de tudo quanto vai decorrendo no ecrã. É um cinema, que apela à inteligência e se esforça por a estimular para chegar mais longe: na compreensão do tipo de armadilhas criadas pelo que estamos a viver para que se adie o mais possível a Utopia, que desejaríamos ainda experimentar em vida...
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